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Governança Corporativa e Gestão Pública VIII: Accountability

Publicado em: 14.06.24 Escrito por: Marcos Antonio Rehder Batista Tempo de leitura: 5 min Temas: Governança Compartilhada, Modernização da Administração, Planejamento Estratégico, Transparência e Combate à Corrupção
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Nos último três conteúdos, onde foram tratadas questões fundamentais para que se garanta equidade nos processos decisórios e no acesso aos benefícios esperados pela gestão pública para cidadãos individuais, parceiros institucionais (políticos e econômicos) e agrupamentos coletivos em torno de pautas específicas (stakeholders),  pode-se dizer que a construção de relações de confiança colaboração e compartilhamento de recursos de uso comum (no caso, os recursos públicos) com toda esta gama de atores foi o objetivo central da Governança Pública. Para tal, assume-se compromissos com estes atores, que esperam que sejam cumpridos ao final. A este momento de prestação de contas sobre o que foi honrado dentro da lei e das promessas que se dá o nome de Accountability.

Este conceito pode ser traduzido para o português como “prestação de contas”, que pode ser vinculada à transparência, ou “responsabilização”, correntemente entendida por conformidade com as leis. Na referência da Rede Governança Brasil que estamos usando nesta série é definida como “responsabilidade com ética e remete à obrigação, à transparência de membros de um órgão administrativo ou representativo de prestar contas a instâncias controladoras ou a seus representados. (…) Quando envolve valores investidos, por exemplo, em algum projeto ou obra para a cidade, é importante divulgar o quanto foi gasto, como foi pago, trata-se da prestação de contas à sociedade, pois estamos falando de dinheiro público.” (p.44). Ou seja, vai além da transparência dos dados e da conformidade com a lei, pode ser entendida como uma satisfação dada pelo agente público tanto sobre a coerência de suas ações com suas promessas quanto sobre a legalidade de suas ações, e este sentido vai ao encontro de como o conceito vem sido trabalhado entre pesquisadores de prestígio na área.

Uma das confusões frequentes sobre seu uso acontece em relação ao princípio da Transparência, pois ambos tratam da equidade ao acesso ao que uma administração faz. Como já foi descrito em artigo anterior, Transparência se refere mais à informação em tempo real, tanto para que se entenda o que está sendo feito e seja possível aos atores da sociedade programarem-se e tirarem o melhor proveito quanto para que irregularidades sejam corrigidas antes do fim da implementação de algo. Já a Accountability refere-se ao balanço das ações e resultados definitivos, ao que foi proposto e às metas alcançadas, ao sentido e às intenções do que foi entregue (ou não). Por fim, é um momento em que as dúvidas finais sobre a justeza das informações que foram fornecidas pelos mecanismos de Transparência e a “responsabilização” dos agentes públicos sobre os resultados bons ou não tão bons.

O modo com que entende-se a ideia de “responsabilização” também leva muitos a incorrer na confusão entre Accountability e Compliance. Enquanto a primeira trata de uma série de respostas sobre os resultados da administração, tanto legais quanto programáticas, a segunda mantém o foco na conformidade com a lei e com princípios éticos do órgão (público ou privado). A primeira se refere aos propósitos dos agentes públicos em relação ao que se espera dele, já a segunda se está empreendendo seus propósitos dentro dos padrões legais definidos pelo poder legislativo, de modo auditável e aceitável pelo judiciário. De fato, quando tomamos por referência apontamentos do TCU, eles até abordam Accountability como um todo, mas concentram atenção em mecanismos de garantia da conformidade (estes sim, de Compliance), como pode ser visto nos critérios para uma boa Accountability propostos no documento do TCU (p.97-98) ao qual se recorreu bastante nesta série:

  1. “informações de interesse geral, e que essas possibilitem uma avaliação do valor que a organização entrega à população”
  2. “canal para recebimento de manifestações das partes interes­sadas”
  3. “designar as instâncias responsáveis por apurar (mediante denúncia ou de ofício) e tratar desvios éticos e infrações disciplinares”
  4. “padronizar procedimentos para orientar a apuração e tratamento de desvios éticos, de ilícitos administrativos e de atos lesivos cometidos por pessoas jurídicas contra a organização”
  5. “capacitar as equipes que compõem as comissões processantes, bem como as de sindicância e de investigação”
  6. “adotar meios de simplificação de apuração e punição de faltas de menor potencial ofensivo”

                Note que, dos 6, apenas o primeiro não trata de Compliance. Como o objetivo nesta série é, antes de tudo, mostrar como é possível para um político se fortalecer politicamente através de mecanismos de Governança, toma-se Compliance como pressuposto da Accountability, assim, priorizamos o item “a” acima, a agregação de valor que a organização entrega para a sociedade. No próximo conteúdo da série serão trazidos alguns elementos em relação a conformidade da atuação política com regras, normas e valores da sociedade, dado que até então tratou-se sobre como lidar com informações, atores, pautas específicas e resultados.

Segue o vídeo, e até o próximo!



*Esse conteúdo pode não refletir a opinião da Comunitas e foi produzido exclusivamente pelo especialista da Nossa Rede Juntos.

Artigo escrito por: Marcos Antonio Rehder Batista
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  1. Saint'Clair do Nascimento Jr. disse:

    Excelente artigo! Denso e ao mesmo tempo didático, sem perder de vista o rigor científico. Recomendo!

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