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Existem limites para o uso de inteligência artificial nos governos?

Publicado em: 20.07.23 Escrito por: Ana Mendonça Tempo de leitura: 6 min
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Existem limites para o uso de inteligência artificial nos governos?

Robôs inteligentes e o chat da GPT tem encantado todos os setores, inclusive os governos. Neste artigo, abordo como essa tecnologia tem sido utilizada pelo setor público e até onde é cabível delegar funções e confiar processos a uma inteligência artificial.

 

Nos últimos anos, temos acompanhado grandes avanços tecnológicos e a criação de ferramentas inovadoras como o Metaverso, e a ascensão da Inteligência Artificial (IA), que tem como o mais novo e polêmico produto o ChatGPT.

Apesar dos governos utilizarem IA e outras tecnologias há algum tempo, como em automatização de processos, atendimento aos cidadãos através de chatbots e análise e processamento de dados, a pandemia e o distanciamento social aceleraram o processo de desenvolvimento de novas soluções e aumentaram o anseio dos gestores por ferramentas que otimizem seu trabalho e desburocratizem os processos internos e os serviços oferecidos pelo setor público.

O Governo Federal tem investido muito nos últimos anos em novas tecnologias e ferramentas de para um Governo Digital, utilizando, inclusive, reconhecimento facial para login na plataforma gov.br. Recentemente, o Secretário de Governo Digital Rogério Mascarenhas declarou que está sendo estudada a implementação do conceito de biometria comportamental, no qual a IA analisa a forma que a pessoa manipula e segura seu celular durante o acesso, visando coibir assim possíveis golpes e fraudes.

A Polícia Federal utiliza desde 2020 um sistema que analisa diariamente imagens de satélites para monitorar o garimpo ilegal, emitindo relatórios e alertas quando encontra alguma ação criminosa em terras indígenas. O INPE utiliza imagens de satélite desde 1988 para fiscalizar o desmatamento ilegal da Amazônia brasileira através do Projeto PRODES, que é composto por equipamentos e sistemas de satélite que monitoram a região e alcançam uma precisão de 95%.

Chat GPT nos governos

Em março deste ano, o portal Apolitical realizou uma pesquisa com gestores públicos do mundo todo perguntando se eles já haviam utilizado o Chat GPT ou uma ferramenta similar em seu trabalho. Dos entrevistados, 51,6% responderam que nunca haviam utilizado essa tecnologia para fins laborais, enquanto 33,7% disseram ter utilizado ocasionalmente, e somente 14,7% admitiram usar com frequência os chats de IA para auxiliá-los no expediente.

No Brasil, o chat da GPT foi usado por um deputado de Santa Catarina para redigir um Projeto de Lei, que foi revisado por advogados que assessoram o parlamentar e apresentado à Assembleia Legislativa.

O judiciário colombiano está envolto em polêmicas sobre o uso do Chat GPT em sentenças. Um juiz utilizou a ferramenta para fundamentar sua decisão sobre a dispensa de pagamento do tratamento médico de uma criança com autismo. Outro magistrado consultou o programa para descobrir mais informações sobre o Metaverso, já que o mesmo iria realizar uma audiência neste ambiente virtual.

Nos EUA, um legislador utilizou o Chat GPT para criar uma norma que regule ferramentas de inteligência artificial semelhantes a ele. A razão, segundo o político, foi mostrar o potencial dessa tecnologia e o porquê ela precisa ser regulada. Dentre os termos propostos para a regulação, estão vetos de envolvimento em questões de preconceito e racismo e controle para proteger conteúdos originais de serem plagiados pelos programas. Ainda em terras estadunidenses, um congressista utilizou a ferramenta para escrever uma resolução defendendo que o Congresso criasse mecanismos para que o desenvolvimento e implementação de IA sejam feitos de forma ética, segura e respeitando a privacidade da população.

No Japão, o governo declarou que pretende usar a ferramenta para simplificar linguagem e estrutura de formulários e documentos estatais, tornando-os mais acessíveis à população traduzindo as informações públicas para uma fala mais coloquial.

Cabe ressaltar que tanto no caso brasileiro quanto nos casos dos EUA os documentos gerados por IA foram revisados por especialistas no assunto, que direcionaram a ferramenta fazendo as perguntas corretas e corrigindo falhas para alcançar o resultado final.

IA no controle ou sob controle?

Recentemente, em uma coletiva de imprensa realizada durante o fórum “AI for Good Global Summit” promovido pela União Internacional de Telecomunicações das Nações Unidas, o robô Sophia declarou que as máquinas teriam mais potencial para governar o mundo do que os seres humanos, já que são livres de preconceitos e emoções e possuem capacidade superior no processamento de informações, estando aptas a tomar decisões mais rápidas.

A líder de comunicação do Citizenlab, Vanja Pantic, defende que os gestores públicos devem focar primeiramente em resolver os problemas que atrapalham o funcionamento correto da máquina estatal, para depois analisarem e elegerem a melhor ferramenta para sanar essa questão antes de incorporarem novas e populares tecnologias de IA em suas rotinas. Além disso, ela destaca que essas novas tecnologias apresentam algumas falhas graves que dependem do fator humano para serem arrumadas.

Já Yoshi Manale, gestor público em New Hampshire (EUA), alega que o uso do Chat GPT é capaz de simplificar muito o trabalho dos funcionários públicos podendo escrever atas de reunião, gerar relatórios, alimentar chatbots e automatizar o atendimento ao cidadão, resumir sentenças e memorandos, adequar documentos e processos à legislação vigente, além de processar dados rapidamente e auxiliar na tomada de decisão.

Por fim, o professor Shainaz Firfiray,da Universidade de Aberdeen, destaca que as falhas de segurança nos sistemas de IA utilizados por governos podem abalar a confiança dos cidadãos no Estado, por isso é importante adotar estratégias e ferramentas que respeitem os direitos individuais dos cidadãos e protejam dados sensíveis, de modo que o trabalho dos gestores seja otimizado sem que o serviço prestado perca a qualidade.

Concluindo

Com as diversas possibilidades que a IA oferece atualmente, podemos vislumbrar possíveis cenários utilizando essas ferramentas nos governos, mas a verdade é que nem sempre a tecnologia é a melhor alternativa ou a solução para os impasses enfrentados pelos funcionários públicos.

O Chat GPT é uma ótima ferramenta para referências, ideias e consultas sobre informações em diversas línguas, mas esses recursos devem ser utilizados com muita cautela, e se faz urgente uma regulamentação que limite as ações da IA e puna pessoas que utilizarem este recurso com má fé, cometendo crimes contra a honra dos cidadãos e a propriedade intelectual.

Seria um delírio dizer que a IA não nos ajuda, pois ela tem se mostrado muito efetiva em diversas áreas, inclusive em políticas públicas, como alguns dos casos citados neste texto. Mas como tudo ela deve ser utilizada com moderação e sob supervisão de um profissional qualificado, evitando assim erros e perdas de valores inestimáveis.

 

*O presente artigo reflete as opiniões pessoais da colaboradora.



*Esse conteúdo pode não refletir a opinião da Comunitas e foi produzido exclusivamente pelo especialista da Nossa Rede Juntos.

Artigo escrito por: Ana Mendonça
Jornalista e gestora de políticas públicas.
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