O Dia Mundial Sem Carro surgiu como uma resposta à dependência crescente dos automóveis e seus impactos sobre o meio ambiente e a vida urbana. O movimento teve início na Europa, ainda durante a crise do petróleo na década de 1970, quando algumas cidades passaram a adotar iniciativas para reduzir o uso de veículos motorizados.
Em 1988, a França instituiu oficialmente o dia 22 de setembro como o Dia Mundial Sem Carro, estabelecendo uma data para chamar a atenção da sociedade para a necessidade de alternativas sustentáveis de transporte. Em 2000, a organização World Carfree Network consolidou essa iniciativa em escala global.
No Brasil, a primeira edição do Dia Mundial Sem Carro aconteceu em 2001, ampliando a mobilização para o contexto nacional. Hoje, o objetivo central dessa data é estimular a redução do uso de automóveis e promover alternativas de transporte que contribuam para cidades mais sustentáveis.
Garantir o direito à cidade passa por investir em mobilidade sustentável. Continue a leitura para saber mais!
O direito à cidade e a mobilidade urbana
A mobilidade urbana, se conecta diretamente ao direito coletivo à cidade. Esse princípio, consagrado pela Carta Mundial pelo Direito à Cidade, produzida na virada do século, reconhece que o acesso a um transporte digno, eficiente e seguro é parte fundamental da construção de cidades inclusivas e equitativas.
A mobilidade, portanto, vai muito além do simples deslocamento: ela reflete a capacidade de todos os cidadãos de exercer seus direitos urbanos, acessar oportunidades de emprego, educação, lazer e saúde, e participar plenamente da vida social e econômica da cidade.
Previsto no Estatuto da Cidade, o direito à cidade garante a todas as pessoas o direito de habitar, usar e participar da construção de cidades mais justas, inclusivas, democráticas e sustentáveis. Esse é um direito coletivo, pois a transformação urbana depende da ação conjunta da sociedade sobre os processos de transformação urbana.
Quando o acesso a diferentes modais de transporte é desigual ou insuficiente, surgem barreiras que aprofundam a exclusão social. Da mesma forma, a falta de alternativas de transporte ativo – como ciclovias e calçadas seguras integradas ao transporte público – pode excluir grupos específicos, incluindo crianças, pessoas com deficiência, idosos e comunidades de baixa renda, restringindo sua mobilidade cotidiana e sua participação na cidade.
Modais são os tipos de transporte utilizados para o deslocamento de pessoas ou produtos. No ambiente urbano, os mais comuns são: ônibus, carros, metrô, bicicletas ou mesmo a mobilidade à pé.
A mobilidade urbana desempenha papel central na qualidade de vida e na justiça social. Sistemas de transporte eficientes reduzem tempos de deslocamento, diminuem o estresse e podem incentivar hábitos de vida mais saudáveis. Também ajudam a melhorar a qualidade do ar e a ampliar o acesso a oportunidades urbanas, especialmente para quem vive em áreas periféricas.
Cidades que priorizam a mobilidade garantem a todos os cidadãos o acesso aos espaços urbanos de forma equitativa, fortalecendo a coesão social e promovendo um ambiente urbano mais seguro e acolhedor.
Mobilidade de baixas emissões e bem-estar urbano
No contexto do direito à cidade, a mobilidade de baixas emissões assume papel estratégico na construção de cidades mais sustentáveis. Reduzir o uso de veículos motorizados não é apenas uma medida ambiental: é uma estratégia de saúde pública, pois diminui a concentração de poluentes no ar, que reduz a possibilidade de desenvolver doenças respiratórias e cardiovasculares, e consequentemente, melhora a qualidade de vida.
Além disso, contribui diretamente para a mitigação da crise climática, já que o transporte urbano é um dos maiores emissores de gases de efeito estufa nas cidades brasileiras. Entre 2005 e 2022, as cidades brasileiras registraram um aumento de 46% nas emissões totais de gases de efeito estufa, sendo o transporte urbano responsável por 74% dessas emissões em 2022, contra 22% das edificações e 4% da expansão urbana (crescimento das cidades e aumento da demanda). Esses dados reforçam que a mobilidade sustentável precisa ser um eixo prioritário das políticas públicas urbanas.
Nesse cenário, a mobilidade ativa – deslocamentos realizados por pedestres e ciclistas utilizando apenas a energia do próprio corpo – surge como uma alternativa estratégica e transformadora. Ela vai muito além de substituir o carro: promove saúde física e mental, combate o sedentarismo, fortalece a economia local ao facilitar o acesso a comércios e serviços, e contribui para a coesão social, criando comunidades mais conectadas e ampliando o acesso à espaços públicos adequados.
Aqui, vale reconhecer a bicicleta como um modal de transporte de baixo carbono, saudável e inclusivo, capaz de gerar múltiplos benefícios para a cidade e seus habitantes. Seu uso contribui para a redução da poluição do ar, melhora a saúde física e mental, promove a democratização do espaço urbano e diminui a dependência de combustíveis fósseis. No entanto, a bicicleta deve ser encarada como uma escolha consciente e valorizada, e não como uma imposição. Para que seja uma alternativa viável no cotidiano, é essencial que existam políticas públicas e investimentos em infraestrutura que garantam condições seguras, acessíveis e atraentes para a sua utilização.
Diante disso, os benefícios da mobilidade ativa se refletem também em indicadores de saúde pública. Estudos mostram que pessoas que caminham ou pedalam regularmente apresentam menor risco de desenvolver obesidade, diabetes e doenças crônicas não transmissíveis. Ao mesmo tempo, a redução da dependência de veículos automotores diminui congestionamentos e poluição, reforçando a qualidade ambiental e o bem-estar coletivo.
Ao mesmo tempo, é importante reconhecer que alternativas complementares, como a eletrificação das frotas de ônibus e o incentivo ao uso de carros elétricos, representam medidas relevantes para mitigar as emissões do transporte urbano. Nesse sentido, políticas públicas adequadas são essenciais tanto para viabilizar o financiamento desses veículos quanto para subsidiar tarifas, repensando os custos de todo o sistema de mobilidade.
Adotar a mobilidade de baixas emissões é, portanto, uma estratégia que conecta saúde, justiça social e sustentabilidade ambiental. Cidades que investem em transporte ativo, infraestrutura cicloviária e integração com transporte público não apenas reduzem impactos ambientais, mas também fortalecem a cidadania e garantem o direito de todos de usufruir de espaços urbanos com menor custo e impacto ambiental.
Bicicleta como estratégia de desenvolvimento: o caso de Macaé (RJ)
Uma política pública bem sucedida de mobilidade sustentável é o Programa Pedala Macaé, implementado pelo Instituto Aromeiazero com patrocínio da iniciativa privada e apoio da Secretaria de Mobilidade Urbana de Macaé, demonstra o potencial transformador da bicicleta quando integrada a uma política consistente de mobilidade sustentável.

Legenda: Evento do Pedala Macaé. Fonte: Prefeitura Municipal de Macaé.
Desde 2021, o programa promove a cultura e a economia da bicicleta em Macaé por meio de ações de capacitação, educação, empreendedorismo, mobilização comunitária e melhoria da infraestrutura cicloviária. Quatro projetos estratégicos destacam-se:
- Campanha Bike Parada Não Rola, para recuperação de bicicletas abandonadas e doação a pessoas em situação de vulnerabilidade social;
- Rodinha Zero, que ensinou crianças a pedalar sem rodinhas, beneficiando mais de 600 estudantes de escolas públicas;
- Viver de Bike, curso de mecânica e empreendedorismo, que capacitou 240 pessoas e gerou novas oportunidades de renda;
- Bikeatona, maratona de inovação social que apoiou 16 projetos de negócios e iniciativas comunitárias baseadas na bicicleta.
O programa também inaugurou o Bicibase, centro comunitário localizado no bairro Parque Aeroporto, que se tornou referência para atividades de educação ambiental, oficinas de mecânica, empreendedorismo e debates comunitários. Mais de 3.000 pessoas foram impactadas diretamente pelas ações, e outras 12.000 de forma indireta, consolidando o espaço como um polo de inclusão e transformação territorial.
Na infraestrutura urbana, o Pedala Macaé apoiou a instalação de 900 paraciclos em áreas centrais, orlas e terminais de ônibus, contribuiu para o plantio de árvores ao longo de ciclovias e colaborou com a atualização do plano cicloviário municipal. O programa também atuou em articulação política, apoiando o desenvolvimento de um plano estratégico de cicloturismo, além de incentivar empresas locais com iniciativas como o selo “Empresa Amiga do Ciclista”.
O caso de Macaé demonstra que a bicicleta, quando incorporada a políticas públicas articuladas e consistentes, vai muito além de um meio de transporte: torna-se uma ferramenta de inclusão social, fortalecimento comunitário e desenvolvimento sustentável, mostrando como a mobilidade ativa pode transformar cidades e melhorar a qualidade de vida de seus cidadãos.
O Dia Mundial Sem Carro é uma oportunidade para refletir sobre como podemos construir cidades mais humanas e sustentáveis. A mobilidade urbana, quando planejada de forma inclusiva e de baixas emissões, conecta saúde, justiça social e meio ambiente, fortalecendo a cidadania e a qualidade de vida.
Investir na melhoria de calçadas, transportes públicos verdes e eficientes, bicicletários e na cultura da bicicleta é investir em cidades que respeitam as pessoas e o planeta. Mobilidade sustentável não é apenas uma escolha de transporte: é um compromisso coletivo com o futuro das cidades.
E, você, gestor público? Já conhecia o Dia Mundial Sem Carro? E você sabia da importância de remodelar as cidades para meios de transportes mais verdes e acessíveis? Deixe a sua opinião nos comentários abaixo, queremos saber!
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Somos servidores, prefeitos, especialistas, acadêmicos. Somos pessoas comprometidas com o desenvolvimento dos governos brasileiros, dispostas a compartilhar conhecimento com alto potencial de transformação.
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