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As cidades ao redor do mundo enfrentam uma necessidade urgente de gerenciar os riscos relacionados às inundações, agravados pelas mudanças climáticas. O aumento da frequência e intensidade das chuvas, aliado à rápida urbanização, tem sobrecarregado as infraestruturas urbanas tradicionais.
Segundo um relatório do IPCC, os impactos climáticos são mais severos e generalizados do que se esperava, e eventos de precipitação extrema afetaram cerca de 700 milhões de pessoas globalmente desde a década de 1950. Entre 2000 e 2019, o Escritório da ONU sobre Redução de Risco de Desastres teve 7.348 desastres registrados, resultando em 1,23 milhão de mortes e US$ 2,97 trilhões em perdas econômicas.
No Brasil, a situação é igualmente preocupante. Entre 2013 e 2022, desastres naturais atingiram 5.199 municípios brasileiros, afetando a vida de mais de 42 milhões de pessoas, os dados são da Confederação Nacional de Municípios (CNM). A adoção de soluções baseadas na natureza é essencial para enfrentar esses desafios, e é por isso que as cidades-esponja se tornam um dos principais meios para tornar as cidades resilientes a eventos climáticos.
Continue a leitura para entender melhor!
As cidades-esponja são uma abordagem inovadora para lidar com as enchentes urbanas, promovendo a gestão sustentável das águas pluviais. Essas cidades utilizam soluções baseadas na natureza para absorver e reter água da chuva, prevenindo enchentes e melhorando a qualidade de vida urbana.
Cidade-Esponja é um conceito de cidade sensível à água, remetendo à situação na qual a mesma possui a capacidade de deter, limpar e infiltrar águas usando soluções baseadas na natureza. O desafio consiste em encontrar soluções para transformar a paisagem urbana em uma “esponja”, que absorva as águas em áreas livres ou construídas, recarregando os aquíferos e conduzindo os excedentes para áreas alagáveis ou alagadas. Observatório de Inovação para Cidades Sustentáveis.
Após enchentes devastadoras em Pequim em 2012, que resultaram na morte de mais de 80 pessoas, o governo chinês lançou o “Programa Cidade-Esponja” em 2015, transformando a infraestrutura urbana de grandes cidades como Pequim, Xangai e Shenzhen. Este programa envolveu a criação de mais de 56 mil quilômetros de vias verdes e cerca de 72 mil quilômetros quadrados de áreas verdes e parques.
Quem está por trás da criação do conceito Cidades-Esponja?
Kongjian Yu é o responsável pela criação do conceito, arquiteto paisagista de Pequim, está há mais de 25 anos lutando contra a deterioração das ecologias urbanas. Sua pesquisa sobre Padrões de Segurança Ecológica (1995) e Infraestrutura Ecológica, Planejamento Negativo e Cidades-Esponja (2003) lançou as bases para a política da China liderar iniciativas nacionais de proteção e campanhas de restauração ecológica.
O criador das cidades-esponja, afirma que:
Nós construímos as cidades modernas usando técnicas industriais, dependentes de infraestrutura feita de concreto, canos e bombas.
O sistema de Yu tem um princípio que contraria o que costuma ser o senso comum na gestão das chuvas, que é conter as águas: ele é a favor de dar espaço a elas. Em vez do sistema tradicional centrado no concreto, com canais, represas e sistemas de drenagem, que Yu chama de “infraestrutura cinza”, o arquiteto diz que é mais eficaz e barato desacelerar a velocidade das águas com o aumento de superfícies que as absorvem, preferencialmente vegetação, mas também concreto poroso. O paisagista ganhou reconhecimento internacional por seu conceito de “cidades esponja” uma medida que tem um princípio que contraria o que costuma ser o senso comum na gestão das chuvas, que é conter as águas; ele é a favor de dar espaço às chuvas.(1)
(1). Entrevista do O GLOBO.
Cidades-Esponja: planejamento e desenvolvimento
O planejamento das cidades-esponja pode aumentar a resiliência urbana, promover a sustentabilidade ambiental e melhorar a habitabilidade das regiões afetadas. A criação de áreas verdes, infraestrutura porosa e sistemas de reciclagem de água são fundamentais para enfrentar as mudanças climáticas, sequestrar carbono e conectar a população à biodiversidade.
Como implementar uma Cidade-Esponja?
A estratégia das cidades-esponja se baseia no princípio de que a natureza regula a água. A implementação dessas soluções envolve tanto sistemas naturais quanto feitos pelo homem, mas sempre com a natureza como elemento dominante. Segundo Kongjian Yu, é necessário expandir essa abordagem por várias regiões para criar um “planeta-esponja“, onde a força das águas possa ser dissipada e desacelerada progressivamente.
Objetivos e etapas de implementação
Os principais objetivos da estratégia das cidades-esponja incluem a redução do risco de inundações, a melhoria da gestão hídrica urbana, a promoção da sustentabilidade ambiental e a adaptação às mudanças climáticas. Para atingir esses objetivos, foram seguidas várias etapas de implementação:
- Planejamento e design: desenvolver diretrizes para a criação de espaços urbanos que absorvam, purifiquem e retenham água. Este planejamento inclui a incorporação de áreas verdes, telhados verdes, valas verdes e estruturas de armazenamento de água;
- Projetos piloto: implementar projetos-piloto em diversas cidades para testar e refinar as estratégias de cidades-esponja. Entre 2015 e 2016, cidades como Pequim, Xangai e Shenzhen iniciaram esses projetos;
- Expansão e adaptação: Ccom base nos resultados dos projetos-piloto, expandir a implementação das cidades-esponja para outras regiões e adaptar as soluções às especificidades locais;
- Engajamento e educação: envolver a comunidade e educar os cidadãos sobre a importância das cidades-esponja e como eles podem contribuir para a gestão sustentável da água.
Como enfrentar os impactos das mudanças climáticas nas cidades
Para enfrentar os desafios relacionados à gestão de água em áreas urbanas, especialmente diante das mudanças climáticas, é preciso “lutar contra a água” e investir em soluções duradouras e baseadas na natureza. Assim, foi desenvolvido o conceito de cidades-esponja, que se baseia em três grandes estratégias: contenção da água, redução da velocidade e escoamento e absorção. Essas estratégias são fundamentadas em práticas tradicionais de manejo da água e agricultura, e adaptadas às necessidades modernas das cidades.
Confira com mais detalhes cada uma delas!
- Contenção da água
A primeira estratégia é reter a água assim que ela toca o solo. Isso é alcançado por meio da criação de grandes áreas permeáveis e porosas, não pavimentadas, que funcionam como esponjas. Algumas das medidas incluem:
- Lagos artificiais e áreas de açude: esses elementos são alimentados naturalmente ou por meio de canos que ajudam a escoar a água de rios e represas;
- Telhados e fachadas verdes: essas estruturas são projetadas para reter a água da chuva, reduzindo o escoamento superficial e promovendo a infiltração;
- Valas verdes: compõem-se de valas com áreas verdes e camadas de solo permeáveis por baixo que são usadas para absorver a água da chuva.
- Redução da velocidade
A segunda estratégia é desacelerar o fluxo da água coletada. Em vez de tentar canalizar a água rapidamente para longe em linhas retas, são utilizados métodos que reduzem a velocidade da água, promovendo a sedimentação natural e a purificação:
- Rios tortuosos com vegetação: a ideia é usar a vegetação de margens já existentes para reduzir a velocidade do fluxo de água, permitindo que ela seja absorvida gradualmente pelo solo;
- Várzeas e áreas verdes: essas áreas atuam como esponjas naturais que desaceleram o fluxo de água e criam habitats para animais e áreas verdes, além de purificar a água escoada na superfície por meio de plantas que removem toxinas poluentes e nutrientes.
- Escoamento e Absorção
A terceira estratégia é adaptar as cidades para terem áreas alagáveis, onde a água possa escoar sem causar destruição. Isso envolve a criação de estruturas naturais e infraestruturas projetadas para gerenciar a água de maneira eficaz:
- Estruturas naturais alagáveis: são as áreas projetadas para conter a água temporariamente, permitindo que ela seja gradualmente absorvida pelo lençol freático;
- Caixas infiltrantes: as caixas facilitam a entrada da água no solo, promovendo a recarga dos aquíferos;
- Jardins de chuva e tanques subterrâneos: jardins de chuva armazenam o excesso de chuva em tanques subterrâneos e túneis, liberando a água aos poucos nos rios após a diminuição dos níveis de água.
Resultados e impactos globais
Pesquisadores da Arup analisaram os centros urbanos de dez cidades globais: Auckland, Montreal, Mumbai, Nairóbi, Nova York, Londres, Singapura, Xangai, Sydney e Toronto. Usando o Terrain, foi feito um cálculo da quantidade de áreas verdes e azuis nos centros urbanos de cada cidade. Em seguida, os pesquisadores consideraram o impacto dos tipos de solo e da vegetação e calcularam o potencial de escoamento da água da chuva.
O relatório “Global Sponge Cities Snapshot” usa Inteligência Artificial e análise do uso do sol. Nele, cada cidade foi avaliada com uma porcentagem de “capacidade de esponja” de 1-100%. Cidades com classificações mais altas podem absorver mais água durante a chuva. Auckland, na Nova Zelândia, ficou no topo com uma classificação de 35% – na maioria graças aos seus sistemas de águas pluviais, muitos campos de golfe, parques verdes e jardins residenciais.
Tabela de classificação das cidades:
Cidade | Ranking de ‘Esponjosidade’
(Sponge Ranking) |
Percentual geral de “esponjosidade”
(Overall % ‘sponginess’) |
Percentual de área verde e azul
(Green-Blue Area %) |
Classificação do Solo e Potencial de Escoamento
(Soil Classification and Runoff Potential) |
Auckland | 1 | 35% | 50% | Potencial de escoamento moderadamente alto
(<60% de areia e 10-20% de argila) |
Nairóbi | 2 | 34% | 52% | Potencial de escoamento alto
(<50% de areia e >40% de argila) |
Cingapura | 3 | 30% | 45% | Potencial de escoamento moderadamente alto
(<60% de areia e 20-50% de argila) |
Mumbai | 3 | 30% | 45% | Alto potencial de escoamento
(<50% areia e 20-40% argila) |
Nova York | 3 | 30% | 39% | Potencial de escoamento moderadamente baixo
(40-70% de areia e <10% de argila) |
Toronto | 3 | 30% | 39% | Potencial de escoamento moderadamente alto
(<50% areia, 20-40% argila) |
Montreal | 4 | 29% | 36% | Potencial de escoamento moderadamente alto
(<50% areia e 20-40% argila) |
Xangai | 5 | 28% | 33% | Potencial de escoamento moderadamente alto
(<50% areia e 20-40% argila) |
Londres | 6 | 22% | 31% | Potencial de escoamento moderadamente alto
(<50% areia e 20-40% argila) |
Sydney | 7 | 18% | 24% | Potencial de escoamento moderadamente alto
(>60% areia, 10-30% argila) |
Importância da adaptação urbana e das cidades-esponja para o futuro
Os resultados mostraram que muitas das iniciativas-piloto tiveram um efeito positivo, com projetos de baixo impacto, como telhados verdes e jardins de chuva, desacelerando o escoamento. Uma das cidades que demonstraram mais entusiasmo em relação ao projeto, Zhengzhou, na província de Henan (China), recebeu 60 bilhões de yuans (cerca de R$ 42 bilhões).
O estudo da Arup destaca a eficácia das estratégias de cidades-esponja em diversas regiões urbanas. As cidades com maior “capacidade de esponja” demonstram uma integração bem-sucedida de infraestrutura verde e azul, gestão eficiente de escoamento e adaptação às características do solo. A implementação dessas estratégias pode servir de modelo para outras cidades enfrentarem desafios relacionados às mudanças climáticas e ao manejo das águas pluviais.
A partir das informações trazidas neste texto, em comparação aos países estudados no relatório exposto, podemos ver o quanto o Brasil ainda deve correr atrás de medidas de adaptação ao clima para tornar as suas cidades mais resilientes a eventos extremos.
Mas, e você, gestor público? Conhece outra iniciativa inovadora para a Rede Juntos trazer mais conhecimento? Conta para nós nos comentários ou mande via email para redejuntos@comunitas.org.br.
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