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Cidades-Esponja como solução para uma infraestrutura urbana resiliente

Publicado em: 05.06.24 Escrito por: Redação Tempo de leitura: 10 min Temas: Desenvolvimento Verde, Meio ambiente e Sustentabilidade, Planejamento Urbano
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As cidades ao redor do mundo enfrentam uma necessidade urgente de gerenciar os riscos relacionados às inundações, agravados pelas mudanças climáticas. O aumento da frequência e intensidade das chuvas, aliado à rápida urbanização, tem sobrecarregado as infraestruturas urbanas tradicionais. 

Segundo um relatório do IPCC, os impactos climáticos são mais severos e generalizados do que se esperava, e eventos de precipitação extrema afetaram cerca de 700 milhões de pessoas globalmente desde a década de 1950. Entre 2000 e 2019, o Escritório da ONU sobre Redução de Risco de Desastres teve 7.348 desastres registrados, resultando em 1,23 milhão de mortes e US$ 2,97 trilhões em perdas econômicas.

No Brasil, a situação é igualmente preocupante. Entre 2013 e 2022, desastres naturais atingiram 5.199 municípios brasileiros, afetando a vida de mais de 42 milhões de pessoas, os dados são da Confederação Nacional de Municípios (CNM). A adoção de soluções baseadas na natureza é essencial para enfrentar esses desafios, e é por isso que as cidades-esponja se tornam um dos principais meios para tornar as cidades resilientes a eventos climáticos.  

Continue a leitura para entender melhor! 

As cidades-esponja são uma abordagem inovadora para lidar com as enchentes urbanas, promovendo a gestão sustentável das águas pluviais. Essas cidades utilizam soluções baseadas na natureza para absorver e reter água da chuva, prevenindo enchentes e melhorando a qualidade de vida urbana. 

Cidade-Esponja é um conceito de cidade sensível à água, remetendo à situação na qual a mesma possui a capacidade de deter, limpar e infiltrar águas usando soluções baseadas na natureza. O desafio consiste em encontrar soluções para transformar a paisagem urbana em uma “esponja”, que absorva as águas em áreas livres ou construídas, recarregando os aquíferos e conduzindo os excedentes para áreas alagáveis ou alagadas. Observatório de Inovação para Cidades Sustentáveis. 

Após enchentes devastadoras em Pequim em 2012, que resultaram na morte de mais de 80 pessoas, o governo chinês lançou o “Programa Cidade-Esponja” em 2015, transformando a infraestrutura urbana de grandes cidades como Pequim, Xangai e Shenzhen. Este programa envolveu a criação de mais de 56 mil quilômetros de vias verdes e cerca de 72 mil quilômetros quadrados de áreas verdes e parques.

Foto: Parque alagável Yanweizhou, na cidade de Jinhua, China. Foto: Jinhua Yanweizhou Park, Turenscape.

Quem está por trás da criação do conceito Cidades-Esponja?

Kongjian Yu é o responsável pela criação do conceito, arquiteto paisagista de Pequim, está há mais de 25 anos lutando contra a deterioração das ecologias urbanas. Sua pesquisa sobre Padrões de Segurança Ecológica (1995) e Infraestrutura Ecológica, Planejamento Negativo e Cidades-Esponja (2003) lançou as bases para a política da China liderar iniciativas nacionais de proteção e campanhas de restauração ecológica. 

O criador das cidades-esponja, afirma que:

Nós construímos as cidades modernas usando técnicas industriais, dependentes de infraestrutura feita de concreto, canos e bombas.

O sistema de Yu tem um princípio que contraria o que costuma ser o senso comum na gestão das chuvas, que é conter as águas: ele é a favor de dar espaço a elas. Em vez do sistema tradicional centrado no concreto, com canais, represas e sistemas de drenagem, que Yu chama de “infraestrutura cinza”, o arquiteto diz que é mais eficaz e barato desacelerar a velocidade das águas com o aumento de superfícies que as absorvem, preferencialmente vegetação, mas também concreto poroso. O paisagista ganhou reconhecimento internacional por seu conceito de “cidades esponja” uma medida que tem um princípio que contraria o que costuma ser o senso comum na gestão das chuvas, que é conter as águas; ele é a favor de dar espaço às chuvas.(1)

(1). Entrevista do O GLOBO

Cidades-Esponja: planejamento e desenvolvimento

O planejamento das cidades-esponja pode aumentar a resiliência urbana, promover a sustentabilidade ambiental e melhorar a habitabilidade das regiões afetadas. A criação de áreas verdes, infraestrutura porosa e sistemas de reciclagem de água são fundamentais para enfrentar as mudanças climáticas, sequestrar carbono e conectar a população à biodiversidade.

Como implementar uma Cidade-Esponja?

Foto: Projeto de implementação da cidade-esponja em Beijing (Daxing Area Beijing Conceptual Urban Design).

A estratégia das cidades-esponja se baseia no princípio de que a natureza regula a água. A implementação dessas soluções envolve tanto sistemas naturais quanto feitos pelo homem, mas sempre com a natureza como elemento dominante. Segundo Kongjian Yu, é necessário expandir essa abordagem por várias regiões para criar um “planeta-esponja“, onde a força das águas possa ser dissipada e desacelerada progressivamente.

Objetivos e etapas de implementação

Os principais objetivos da estratégia das cidades-esponja incluem a redução do risco de inundações, a melhoria da gestão hídrica urbana, a promoção da sustentabilidade ambiental e a adaptação às mudanças climáticas. Para atingir esses objetivos, foram seguidas várias etapas de implementação:

  1. Planejamento e design: desenvolver diretrizes para a criação de espaços urbanos que absorvam, purifiquem e retenham água. Este planejamento inclui a incorporação de áreas verdes, telhados verdes, valas verdes e estruturas de armazenamento de água;
  2. Projetos piloto: implementar projetos-piloto em diversas cidades para testar e refinar as estratégias de cidades-esponja. Entre 2015 e 2016, cidades como Pequim, Xangai e Shenzhen iniciaram esses projetos;
  3. Expansão e adaptação: Ccom base nos resultados dos projetos-piloto, expandir a implementação das cidades-esponja para outras regiões e adaptar as soluções às especificidades locais;
  4. Engajamento e educação: envolver a comunidade e educar os cidadãos sobre a importância das cidades-esponja e como eles podem contribuir para a gestão sustentável da água.

Como enfrentar os impactos das mudanças climáticas nas cidades

Para enfrentar os desafios relacionados à gestão de água em áreas urbanas, especialmente diante das mudanças climáticas, é preciso “lutar contra a água” e investir em soluções duradouras e baseadas na natureza. Assim, foi desenvolvido o conceito de cidades-esponja, que se baseia em três grandes estratégias: contenção da água, redução da velocidade e escoamento e absorção. Essas estratégias são fundamentadas em práticas tradicionais de manejo da água e agricultura, e adaptadas às necessidades modernas das cidades. 

Confira com mais detalhes cada uma delas!

  1. Contenção da água

A primeira estratégia é reter a água assim que ela toca o solo. Isso é alcançado por meio da criação de grandes áreas permeáveis e porosas, não pavimentadas, que funcionam como esponjas. Algumas das medidas incluem:

  • Lagos artificiais e áreas de açude: esses elementos são alimentados naturalmente ou por meio de canos que ajudam a escoar a água de rios e represas;
  • Telhados e fachadas verdes: essas estruturas são projetadas para reter a água da chuva, reduzindo o escoamento superficial e promovendo a infiltração;
  • Valas verdes: compõem-se de valas com áreas verdes e camadas de solo permeáveis por baixo que são usadas para absorver a água da chuva.
  1. Redução da velocidade

A segunda estratégia é desacelerar o fluxo da água coletada. Em vez de tentar canalizar a água rapidamente para longe em linhas retas, são utilizados métodos que reduzem a velocidade da água, promovendo a sedimentação natural e a purificação:

  • Rios tortuosos com vegetação: a ideia é usar a vegetação de margens já existentes para reduzir a velocidade do fluxo de água, permitindo que ela seja absorvida gradualmente pelo solo;
  • Várzeas e áreas verdes: essas áreas atuam como esponjas naturais que desaceleram o fluxo de água e criam habitats para animais e áreas verdes, além de purificar a água escoada na superfície por meio de plantas que removem toxinas poluentes e nutrientes.
  1. Escoamento e Absorção

A terceira estratégia é adaptar as cidades para terem áreas alagáveis, onde a água possa escoar sem causar destruição. Isso envolve a criação de estruturas naturais e infraestruturas projetadas para gerenciar a água de maneira eficaz:

  • Estruturas naturais alagáveis: são as áreas projetadas para conter a água temporariamente, permitindo que ela seja gradualmente absorvida pelo lençol freático;
  • Caixas infiltrantes: as caixas facilitam a entrada da água no solo, promovendo a recarga dos aquíferos;
  • Jardins de chuva e tanques subterrâneos: jardins de chuva armazenam o excesso de chuva em tanques subterrâneos e túneis, liberando a água aos poucos nos rios após a diminuição dos níveis de água.

Resultados e impactos globais

Pesquisadores da Arup analisaram os centros urbanos de dez cidades globais: Auckland, Montreal, Mumbai, Nairóbi, Nova York, Londres, Singapura, Xangai, Sydney e Toronto. Usando o Terrain, foi feito um cálculo da quantidade de áreas verdes e azuis nos centros urbanos de cada cidade. Em seguida, os pesquisadores consideraram o impacto dos tipos de solo e da vegetação e calcularam o potencial de escoamento da água da chuva. 

O relatório Global Sponge Cities Snapshotusa Inteligência Artificial e análise do uso do sol. Nele, cada cidade foi avaliada com uma porcentagem de “capacidade de esponja” de 1-100%. Cidades com classificações mais altas podem absorver mais água durante a chuva. Auckland, na Nova Zelândia, ficou no topo com uma classificação de 35% – na maioria graças aos seus sistemas de águas pluviais, muitos campos de golfe, parques verdes e jardins residenciais.

Tabela de classificação das cidades:

Cidade Ranking de ‘Esponjosidade’

(Sponge Ranking)

Percentual geral de “esponjosidade”

(Overall % ‘sponginess’)

Percentual de área verde e azul

(Green-Blue Area %)

Classificação do Solo e Potencial de Escoamento

(Soil Classification and Runoff Potential)

Auckland 1 35% 50% Potencial de escoamento moderadamente alto

(<60% de areia e 10-20% de argila)

Nairóbi 2 34% 52% Potencial de escoamento alto

(<50% de areia e >40% de argila)

Cingapura 3 30% 45% Potencial de escoamento moderadamente alto

(<60% de areia e 20-50% de argila)

Mumbai 3 30% 45% Alto potencial de escoamento

(<50% areia e 20-40% argila)

Nova York 3 30% 39% Potencial de escoamento moderadamente baixo

(40-70% de areia e <10% de argila)

Toronto 3 30% 39% Potencial de escoamento moderadamente alto

(<50% areia, 20-40% argila)

Montreal 4 29% 36% Potencial de escoamento moderadamente alto

(<50% areia e 20-40% argila)

Xangai 5 28% 33% Potencial de escoamento moderadamente alto

(<50% areia e 20-40% argila)

Londres 6 22% 31% Potencial de escoamento moderadamente alto

(<50% areia e 20-40% argila)

Sydney 7 18% 24% Potencial de escoamento moderadamente alto

(>60% areia, 10-30% argila)

Importância da adaptação urbana e das cidades-esponja para o futuro

Os resultados mostraram que muitas das iniciativas-piloto tiveram um efeito positivo, com projetos de baixo impacto, como telhados verdes e jardins de chuva, desacelerando o escoamento. Uma das cidades que demonstraram mais entusiasmo em relação ao projeto, Zhengzhou, na província de Henan (China), recebeu 60 bilhões de yuans (cerca de R$ 42 bilhões).

O estudo da Arup destaca a eficácia das estratégias de cidades-esponja em diversas regiões urbanas. As cidades com maior “capacidade de esponja” demonstram uma integração bem-sucedida de infraestrutura verde e azul, gestão eficiente de escoamento e adaptação às características do solo. A implementação dessas estratégias pode servir de modelo para outras cidades enfrentarem desafios relacionados às mudanças climáticas e ao manejo das águas pluviais.

A partir das informações trazidas neste texto, em comparação aos países estudados no relatório exposto, podemos ver o quanto o Brasil ainda deve correr atrás de medidas de adaptação ao clima para tornar as suas cidades mais resilientes a eventos extremos. 

Mas, e você, gestor público? Conhece outra iniciativa inovadora para a Rede Juntos trazer mais conhecimento? Conta para nós nos comentários ou mande via email para redejuntos@comunitas.org.br.  

 

 

 

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