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7 dicas das ciências comportamentais em políticas públicas

Publicado em: 25.05.23 Escrito por: Redação Tempo de leitura: 9 min
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A aplicação das ciências comportamentais nas políticas públicas tem-se tornado prática cada vez mais frequente. Em todo o mundo, instituições públicas estão criando unidades de aplicação da metodologia para o desenvolvimento de políticas públicas. Países como Inglaterra, Estados Unidos, Nova Zelândia, Holanda, Austrália, França, Singapura, entre muitos outros, possuem suas próprias Behavioral Insights Units (Unidades de Insights Comportamentais, em tradução livre) em diversos níveis de governo.

As ciências comportamentais são uma área multidisciplinar de conhecimento que estuda o comportamento humano, ou do agente, que envolvem análises das áreas de economia comportamental, psicologia cognitiva e social, neurociências, sociologia e antropologia.

Portanto, quando se fala em ciências comportamentais, o que se aborda é, necessariamente, qualquer constituição multidisciplinar que tenha os seguintes objetivos: criar e desenvolver intervenções ou políticas de mudança comportamental que procurem resolver questões comportamentais concretas, bem como explicar ou prever juízos, decisões e/ou comportamentos concretos.

A criação de políticas públicas precisa ser um processo empático, que leve em consideração tanto as necessidades quanto os anseios das pessoas. Para isso, é necessário levar em conta o comportamento dos indivíduos. A partir da análise comportamental dos cidadãos, é possível aumentar a efetividade de políticas públicas, um sonho para qualquer gestor.

Introduzir a metodologia de ciências comportamentais no processo de criação de políticas públicas não exige alto investimento financeiro, muito pelo contrário. Na grande maioria das vezes, os incentivos para direcionar a população na direção correta (ou nudges, como é mais conhecido) são ações de baixo custo que se baseiam, justamente, no comportamento humano. Para entender como tudo isso funciona, venha conferir as 7 dicas que trouxemos para vocês!

 

1 – O processo de tomada de decisão das pessoas nem sempre se baseia em questões racionais

Entre os anos de 2008 e 2011, foram lançadas duas publicações basilares da metodologia de nudges que discutem como os processos de tomada de decisão nem sempre são tão racionais como se supõe. Anteriormente, acreditava-se que a racionalidade humana, tal qual tradicionalmente compreendida na economia, parte do princípio que os indivíduos sempre pesam os prós e contras de cada decisão, prezando pela máxima eficiência de suas escolhas.

Ledo engano. A verdade é que o comportamento humano, muitas vezes, se desvia daquilo que seria considerado um “comportamento racional”. Embora possa existir a intenção de concretizar ações que possam proporcionar mais benefício e bem-estar, existe uma diferença entre o que se pretende (a intenção) e o que realmente se faz no dia-a-dia – o intention-action gap (lacuna entre a intenção e a ação) – algo que ilustra bem como o comportamento humano não é regido exclusivamente pela razão.

Também é preciso levar em consideração que o processo de tomada de decisão dos indivíduos também depende de vários fatores, como valores pessoais, grau de instrução e o ambiente no qual eles estão inseridos.

 

2 – Por meio do entendimento de como as pessoas se comportam, é possível aplicar políticas públicas mais eficazes

Existe uma teoria que parte de um pressuposto bastante simples: a racionalidade humana permite que as pessoas sejam capazes de ordenar suas preferências (caracterizadas como estáveis), em uma “escala pré-definida” para ser consultada a qualquer momento de tomada de decisão.

Segundo a visão econômica clássica, os humanos escolhem a partir de um número fixo de alternativas acerca das quais conhecem os custos e benefícios associados e, assim, tentam maximizar a utilidade das suas escolhas. Ou seja, em tese, as pessoas se baseiam constantemente na busca do maior bem-estar possível ao menor custo. Assim sendo, os agentes são vistos como centrados, egoístas e maximizadores.

Mas as pessoas não são assim. O processo de tomada de decisão de um indivíduo é influenciado tanto por motivações externas quanto internas. As suposições acerca do comportamento humano, elaboradas por essa teoria, nem sempre se adequam ao que se verifica na prática.

Dessa forma, surgem uma série de estudos que mostram, por exemplo, que o processo de tomada de decisões das pessoas é influenciada pela forma como as opções se apresentam no dia-a-dia, pela disposição para assumir riscos, por desvios cognitivos e por equívocos presentes, sobretudo em seus processos mentais automáticos. Como a capacidade de foco e atenção dos humanos é limitada, a racionalidade também o é. Por isso, normalmente os indivíduos se usam de atalhos mentais (conhecidos como heurísticas) que facilitam a tomada de decisões.

 

3 – O efeito bumerangue: comportamentos que podem se voltar contra uma política pública

Em algumas ocasiões, as intervenções podem mudar o comportamento alvo, mas no sentido oposto ao desejado. Em psicologia social, isso é chamado de “efeito bumerangue”, que é quando as pessoas reagem negativamente à mensagem recebida, mesmo que a entenda da forma pretendida. Nesses casos, os agentes falham deliberadamente em cumprir com a proposta e fazem justamente o contrário, em especial, quando encontram argumentos mais válidos do que os apresentados na intervenção.  

Estudos apontam que, nesses casos, verificam-se efeitos indesejados de reatância, que é quando a pessoa sente uma “ameaça” à sua autonomia de escolha e atua para restaurá-la. Por exemplo, muitas campanhas educativas visam alterar escolhas alimentares, fornecendo informação sobre as consequências negativas do consumo de alimentos pouco saudáveis. Na prática, as pessoas podem reagir optando por alimentos pouco saudáveis, preservando um sentido de autonomia (“não vou mudar meus hábitos apenas porque querem me obrigar”).

Para evitar situações como essa, é importante estudar muito bem a população-alvo e as suas características. Além disso, devem ser feitos esforços no sentido de fazer perceber a intervenção como algo que não tire a autonomia das pessoas.

 

4 – Os nudges atuam como facilitadores da tomada de decisões em um contexto de incerteza sobre o que escolher

É normal que as pessoas sintam-se sobrecarregadas com a ideia de fazer uma escolha diante de várias opções. Nesses casos, os nudges podem ser utilizados para facilitar o processo de tomada de decisão de um indivíduo que vá mais de acordo com suas preferências pessoais, mas que poderia não ser escolhida diante da complexidade causada pelo excesso de opções.

Por exemplo, uma pessoa pode ter a intenção de se alimentar de forma mais saudável. Entretanto, o cumprimento desse objetivo é dificultado pelo fácil acesso a comidas menos saudáveis. Dessa forma, aplicar nudges que destaquem e facilitem o acesso a uma alimentação mais nutritiva irá apenas facilitar o processo de decisão de um indivíduo (ao eliminar o intention-action gap), ajudando a que possa, finalmente, cumprir com o seu objetivo. Ou seja, o nudge pode funcionar como um facilitador que liberta a carga cognitiva de forma a permitir uma decisão mais clara e em consonância com os próprios desejos.  

Você já leu o nosso artigo sobre a experiência do Rio de Janeiro promovendo segurança viária através das ciências comportamentais? Clique aqui!

 

5 – É fundamental que políticas públicas sejam criadas a partir da fundamentação em dados e evidências para se evitar decisões enviesadas

Para que uma intervenção possa ser bem sucedida, é necessário levar se em consideração o tratamento de dados sobre comportamentos individuais, bem como processos de testagem de intervenções piloto.

Em termos de comportamento-alvo, é importante que a conduta que se tenta promover seja de interesse público e que esteja alinhada com as prioridades governamentais. Todas as pessoas estão sujeitas a vieses e opiniões próprias – e os gestores de políticas públicas não são exceção. E para evitar tomar decisões enviesadas, é crucial que estas estejam sempre fundamentadas em evidências.

Já com relação ao tratamento de dados, é importante que os experimentos sejam realizados sempre com o consentimento e participação voluntária de um indivíduo, além da responsabilidade com as informações fornecidas, o que que já é preconizado pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

 

6 – É necessário monitorar o desenvolvimento dos efeitos e as consequências da intervenção a longo-prazo

Após a aplicação da intervenção, sendo ela bem sucedida, é necessário monitorar o desenvolvimento dos efeitos e as consequências da intervenção a longo-prazo.As estratégias comportamentais utilizadas nem sempre produzem o mesmo padrão de resultados ao longo do tempo, fazendo com que o planejamento e a vigilância sejam cruciais, não só como uma importante fonte de informação, mas também como forma de evitar impactos negativos no público-alvo.

 

7 – A construção de uma intervenção baseada em comportamento deve seguir um modelo comportamental 

Para desenvolver uma intervenção – qualquer que ela seja – é fundamental definir dois pontos:

  • Quais comportamentos queremos evitar?
  • Quais comportamentos queremos incentivar?

Pensar nessas duas questões não é tudo, mas é um bom começo para entender se realmente será possível propor uma intervenção comportamental e, possivelmente, qual será o foco da mesma. Assim, é importante ter em consideração que a intervenção pode ser desenvolvida no sentido de evitar um comportamento ou de incentivar um outro. O que será feito dependerá do objetivo da política pública e das ações que estão sendo desenvolvidas nesse sentido.

Contudo, para desenvolver uma intervenção comportamental, é preciso um diagnóstico comportamental objetivo através das diversas ferramentas desenvolvidas para incentivar essas mudanças, como os modelos BASIC, MINDSPACE e COM-B. 

Quando adequadamente aplicadas, essas ferramentas vão apontar, na grande maioria, o que pode ser um causador de um determinado comportamento a ser mudado, auxiliando a criação de intervenções que realmente tenham potencial para funcionar.

 

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