Contratualização de restaurantes populares: inovação e eficiência na assistência social
Historicamente, a assistência social no Brasil foi desenvolvida principalmente por meio de ações diretas do Estado, com os próprios órgãos públicos oferecendo benefícios e serviços à população. Nos últimos anos, entretanto, experiências de gestão indireta por meio de contratualizações têm ganhado espaço, revelando-se promissoras para aprimorar eficiência, ampliar cobertura e introduzir inovações operacionais.
Nesse contexto, a contratualização de restaurantes populares se destaca como uma saída para garantir a segurança alimentar e a inclusão social, usando modelos de gestão mais modernos para o enfrentamento à fome e a redução de vulnerabilidades em espaços urbanos. Por isso, entender os diferentes arranjos contratuais e seus impactos em indicadores de desempenho e na capacidade de fiscalização é fundamental para fortalecer a qualidade da assistência social.
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Desafios da gestão de restaurantes populares e da proteção social
Os restaurantes populares são equipamentos públicos que oferecem refeições gratuitas ou a preços simbólicos, voltados prioritariamente a populações em situação de vulnerabilidade social. Sua função extrapola o simples fornecimento de alimento, havendo impacto também em outras iniciativas de assistência com o objetivo de enfrentamento da pobreza e da exclusão social.
Em muitos municípios, esses restaurantes ainda funcionam de forma marginal ao Sistema Único de Assistência Social (SUAS), o que gera desafios na articulação de equipes, gestão de recursos e, em especial, na definição de público‑alvo.
Idealmente, os gestores públicos devem se atentar aos dados e ao contexto de pobreza na cidade para definir se os recursos serão focalizados em trabalhadores de baixa renda, desempregados, população em situação de rua ou em públicos mais amplos, sempre considerando as demais políticas de assistência social às quais a população tem acesso. Uma decisão importante dos gestores envolve a cobrança de um pequeno valor, que em algum nível contribuiria para a sustentabilidade financeira da política, mas reduziria acesso dos mais pobres, ao passo que a gratuitidade plena elevaria o custo aos cofres públicos. Essa escolha deve considerar também a capacidade do poder público de manter os padrões de qualidade sob diferentes níveis de demanda. Para garantir maior eficiência operacional, muitos municípios optam por contratualizar esse serviço público, visto que a administração direta muitas vezes carece da agilidade e expertise em logística possuída por empresas privadas ou organizações do terceiro setor. Contudo, ainda que a parceria permita absorver para a gestão pública o know‑how das organizações parceiras, é fundamental haver mecanismos robustos de fiscalização para evitar desvios. Todos esses aspectos devem ser levados em consideração, pois resultarão na definição do modelo contratual da parceria.Dica para o Gestor
Contratos de parceria para gestão de restaurantes populares
Na prática, diferentes arranjos de contratualização têm sido adotados para gerir restaurantes populares, sempre alinhando-se à capacidade institucional local e a interesses políticos específicos. Em geral, a escolha do modelo depende de fatores como a disponibilidade de atores qualificados no mercado ou no terceiro setor, a capacidade de gestão e fiscalização do ente público, e prioridades políticas e orçamentárias.
Uma possibilidade é a estruturação de Termos de Colaboração com OSCs, nos quais o terceiro setor recebe recursos e metas definidas para operacionalizar o serviço. Esse arranjo costuma aproximar o equipamento da comunidade, permitindo flexibilidade para inovações em cardápio e processos, mas sofre com variações na qualidade de fiscalização e na regularidade de auditorias externas.
Outra alternativa são as Concessões Comuns, mais complexas, por envolver contratos de longa duração, com responsabilidade privada por investimentos em infraestrutura, favorecendo a expansão da rede e a padronização de serviços. Nesse modelo, há menor flexibilidade na gestão do serviço do que haveria sob um Termo de Colaboração, mas maior fiscalização e segurança jurídica para responsabilização do parceiro privado em caso de descumprimento de acordos.
Exemplos de contratualizações de restaurantes populares
Com grande experiência no desenvolvimento de parcerias para gestão de restaurantes populares, o Governo do Estado de São Paulo há anos já estrutura contratos com o setor privado por meio do Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC).
O governo operacionaliza desde 2000 o Programa Bom Prato, com o objetivo de oferecer refeições a um custo acessível à população mais vulnerável. O programa totaliza 121 pontos de atendimento no estado, sendo 71 unidades fixas, 46 pontos de atendimento do Bom Prato Móvel e 4 refeitórios. Desse total, o governo estadual contabiliza 86 unidades geridas por meio de parcerias com OSCs a partir de Termos de Colaboração com a Secretaria de Desenvolvimento Estadual. Recentemente, entre maio e junho de 2025, foram assinados dois termos de Colaboração com uma mesma OSC para gerenciar duas unidades do programa: o restaurante popular de Marília, na região Centro-Oeste do estado, e o de Jandira, município da Região Metropolitana de São Paulo. Ambos os contratos têm duração de 12 meses e valor superior a R$ 3 milhões.
Outro exemplo recente vem de Uberaba, município do Triângulo Mineiro. Em junho de 2025, foi concluído o processo licitatório para a concessão do Restaurante Popular de Uberaba, tendo como vencedor uma empresa do estado de São Paulo. A concessão tem duração de cinco anos, com possibilidade de prorrogação, e prevê a possibilidade de oferta de café da manhã, almoço e jantar. Neste contrato, a Prefeitura de Uberaba ficará responsável por fornecer água, energia e equipamentos necessários para a operacionalização do restaurante, encarregando-se também da fiscalização dos serviços prestados. Por outro lado, o operador privado assumirá a função de reparar e fornecer refeições, sendo a remuneração referente ao valor cobrado dos consumidores, que hoje está entre R$ 5 e R$ 6.
Contratos como a concessão em Uberaba, de mais longa duração, atraem investimentos, reduzem custos de transação e possuem mais mecanismos de fiscalização, mas trazem rigidez diante de crises ou mudanças de demanda. Portanto, é importante pensar em cláusulas de revisão que considerem variações de demanda e inflação na elaboração dos acordos.
Já os termos do governo paulista, devido à natureza do MROSC e potencializados pela experiência de longa data da Secretaria, possibilitam maior flexibilidade, devido à autonomia da OSC para adaptar o serviço à realidade local, e proximidade da comunidade, por meio de mecanismos participativos que ampliam o diálogo. Contudo, exigem estrutura robusta de fiscalização para assegurar metas nutricionais e de público-alvo. Nesse tipo de contrato, uma saída para aumentar a transparência e confiança social, facilitando o monitoramento e a prestação de contas, é instituir conselhos gestores com participação efetiva de usuários do restaurante, gestores públicos e da própria OSC.
A experiência dos restaurantes populares demonstra que a contratualização de serviços de assistência social pode, se bem desenhada e monitorada, combinar eficiência operacional, ampliação de acesso e inovações sociais.
Para avançar nessa agenda, recomenda‑se desenvolver modelos‑padrão de contratos com cláusulas de metas e indicadores claros e instituir mecanismos participativos de governança e controle social. Nesse processo, é fundamental capacitar tecnicamente equipes de fiscalização, sistematizar avaliações de impacto social e promover intercâmbio de experiências entre municípios e estados.
Com essas ações, os restaurantes populares podem servir de laboratório para expandir a gestão indireta a outros serviços de assistência social, contribuindo para políticas públicas mais eficientes, transparentes e efetivamente voltadas à redução de vulnerabilidades socioeconômicas.
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Governo do Estado de São Paulo. Programa Bom Prato. | Folha Uberaba. Concluída nova licitação para gestão do Restaurante Popular.
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