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Após o período turbulento da Covid-19, foram datados o aumento da desigualdade e vulnerabilidade social de diversos grupos, situação a qual, dentre outras razões, alimentou problemas sociais e econômicos de maneira nunca vista antes. Em paralelo, o aumento da criminalidade e a expansão do crime organizado, em especial nas cidades, evocaram certos desafios complexos à esfera municipal. Esfera que dentro da estrutura de poder da segurança pública, tem pouca autonomia efetiva.
Mesmo que a segurança seja controlada de forma maior a nível federal e estadual, os governos municipais são os primeiros a serem cobrados pelos cidadãos quando a percepção de insegurança cresce. Pensamento normal, já que quem está mais próximo do cidadão, são os prefeitos, prefeituras e secretarias municipais.
A série Novos Caminhos para a Segurança Pública da Rede Juntos é desenvolvida, não apenas pela importância do papel integrado das três esferas na segurança pública, mas também pelo direito à segurança ser um direito social. Ou seja, é dever do Estado implementar políticas públicas que garantam aos cidadãos o direito de ir e vir, e transitar em qualquer local público que lhe tenha vontade. Além de garantir a defesa da sua integridade física e patrimonial.
O direito à segurança é parte fundamental do direito à qualidade de vida e do próprio direito fundamental à vida, na medida em que a insegurança traz aumento de violência e perturbação à ordem pública e social. – Flávia Ferrer (2007)
Dito isso, é importante trazer uma análise de todos os níveis sobre segurança pública, que por mais que apele certa complexidade ao tema, também traga otimismo de que com políticas públicas integradas, como o combate à pobreza e a geração de empregos, a segurança pode chegar a todos. A série trará desde um nível macro que traga o cenário internacional, como será visto no texto de hoje, até o nível micro, que como dito anteriormente, seria a ponta que impacta diretamente o cidadão, os municípios.
Iniciamos este primeiro texto da série Segurança Pública da Rede Juntos, trazendo o panorama atual segurança internacional, alguns rankings dos melhores e piores países na categoria de segurança, os principais mercados do crime e as tipologias existentes em relação a violência. Vamos lá?
No dia 5 de maio de 2023, a OMS declarou o fim da Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional (ESPII) referente à COVID-19. Um ano depois, é visto como os anos da pandemia exacerbaram certas condições a nível global, como o crescimento da desigualdade, da insegurança alimentar e das tensões geopolíticas-econômicas.
Com o fim da pandemia, ressurgiu-se questões político-sociais que haviam sido deixadas de lado para lidar com a emergência de saúde daquele momento, como o aumento da fome, recessão econômica em diversos países (Japão e Reino Unido, por exemplo), o isolacionismo estadunidense, guerras civis, entre outros.
Neste cenário, interesses criminosos foram beneficiados pela instabilidade econômica do período e pela atenção, do próprio governo, desviada para lidar com a crise sanitária, o que permitiu uma abertura maior para a expansão do crime organizado e, consequentemente, um maior nível de insegurança em diversos países. Como é o caso do Equador que passa por uma grave crise de segurança pública devido ao conflito existente entre facções do crime organizado e forças de segurança. Ou no Haiti, que, segundo a ONU, mais de 53 mil pessoas já fugiram da capital em decorrência a violência das gangues.
Não apenas, também vemos cenários de guerras abertas em outras partes do globo, como na Europa, Oriente Médio e na Ásia. Como a maior guerra terrestre desde a segunda guerra mundial, o conflito entre a Rússia e a Ucrânia, iniciado em 2022 ainda não teve o seu fim. Já evocou uma crise humanitária e interrompeu cadeias de suprimentos globais – que, mais uma vez, impulsionou mercados ilegais, por exemplo o de armamento.
Outros conflitos também não encontraram ainda uma solução e se arrastam por mais de anos, como no Sudão do Sul, no Iêmen e na Síria. Além do conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas na Faixa de Gaza iniciado em outubro de 2023.
Amplitude da Segurança
A Segurança é tão complexa, em muitas razões, devido às suas causas e efeitos serem correlacionadas com outras áreas. Quaisquer mudanças em aspectos sociais-econômicos de uma população influencia diretamente nos níveis de segurança daquele grupo.
Segundo o Global Organized Crime Index, o aumento da inflação em 2022 colocou mais de 250 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar. Essa dificuldade de adquirir necessidades básicas alimentou o crime organizado, pois as pessoas recorreram ao mercado ilegal para obter suprimentos essenciais a preços mais baixos.
Outras preocupações também devem ser levadas em conta neste espaço. Em um mundo cada vez mais digitalizado, os ataques cibernéticos aumentaram 38% globalmente em 2022 em relação ao ano anterior, à medida que hackers e gangues de ransomware exploravam a normalização do trabalho remoto. Estes criminosos usavam softwares para extorquir pessoas por meio de sequestro de dados digitais usando a criptografia.
Esta rápida inovação das tecnologias digitais, também facilitou os crimes financeiros, principalmente de fraude e desfalque, que podem ser realizados com o clique de um botão do outro lado do mundo, destacando o impacto transnacional do mercado.
Na tabela 1, vemos os diferentes mercados do crime a nível global, comparados entre 2021 e 2023. Em 2023, a economia ilícita mais difundida foi a de crimes financeiros, seguida de tráfico humano e mercado ilegal da cannabis. Os maiores aumentos em comparação a 2021, foi o de contrabando de migrantes, mercado ilegal de drogas sintéticas e de cocaína.
Entenda a diferença entre contrabando de migrantes e tráfico humano aqui!
Tabela 1 – Mercados do Crime (2021 x 2023)
Embora os crimes financeiros tenham superado o tráfico de pessoas como a economia ilícita mais difundida, o tráfico humano e também, o contrabando de pessoas aumentaram de forma significativa desde 2021. Na Tabela 2, é possível ver este aumento do tráfico humano (cor laranja) e do contrabando de pessoas (cor marrom) em diferentes regiões do mundo, quando é comparado os dados de 2021 e 2023. Em ambos os casos, os seres humanos são a mercadoria transnacional.
Em 2022, haviam mais de 100 milhões de refugiados e pessoas deslocadas internamente, grande parte destas recorreram a contrabandistas para ajudá-los a escapar de circunstâncias desafiadoras. Criminosos em busca de lucro continuam a contrabandear pessoas fora dos canais de migração legal e através das fronteiras, muitas vezes em condições perigosas, deixando muitos migrantes irregulares vulneráveis à exploração.
Tabela 2 – O aumento do tráfico e contrabando de pessoas (2021 X 2023)
De acordo com este mesmo Index, 83% da população global viveu, em 2023, em países com alta criminalidade – contra 79% em 2021. Ou seja, houve um aumento significativo. Outro aspecto a ser considerado é a corrupção em órgãos estatais e o envolvimento do Estado na criminalidade, o que favorece a difusão do crime organizado em espaços de tomada de decisão.
Em 2023, a economia ilícita mais difundida foi a de crimes financeiros, seguida de tráfico humano e mercado ilegal da cannabis.
Neste ponto é possível compreender o gigantesco leque de desafios a serem enfrentados por agentes que trabalham na segurança pública, não é? Separamos alguns rankings globais para que você entenda a nível macro a situação de alguns países diante de tais violências.
Rankings
Nota: Antes de verificar os dados abaixo, vale lembrar que a complexidade do tema também é refletida na coleta e análise de dados que tragam veracidade nos crimes e violências enfrentados em todo o globo. Por este motivo, você, leitor, encontrará em alguns rankings com colocações de países tanto em posições favoráveis quanto em posições que ainda precisam melhorar. No entanto, existem algumas organizações que optaram por divulgar apenas os melhores colocados. Dito isso, vamos agora conferir os rankings abaixo!
Domínio de Segurança e Proteção (Global Peace Index, 2023)
- 1° posição: Finlândia; 2° posição: Japão; 3° posição: Islândia…
- 161° posição: Síria; 160° posição: Sudão do Sul; 159° posição: Congo…
Taxa de Homicídio (por 100.000 hab.) (Statista, 2023)
- 1°: El Salvador, 2°: Jamaica, 3°: Lesoto, 4°: Honduras, 5°: Belize, 16°: Brasil
Crime organizado (Global Organized Crime Index, 2023)
- 1°: Mianmar, 2°: Colômbia, 3°: México, 4°: Paraguai, 5°: Congo, 22°: Brasil
Apreensões de drogas (UNODC, 2017-2021)
- 1°: Tailândia, 2°: Mianmar, 3°: Arabia Saudita, 4°: Turquia, 5°: Emirados Árabes
População encarcerada (World Prison Brief, sem data) (do maior ao menor índice)
- 1°: El Salvador, 2°: Cuba, 3°: Ruanda, 4°: Turcomenistão, 5°: Samoa Americana, 14°: Brasil
- 221°: Gâmbia, 222°: Liechtenstein, 223°: San Marino
Corrupção (Índice de Percepção da Corrupção, 2023)(do menor ao maior índice)
- 1°: Dinamarca, 2°: Finlândia, 3°: Nova Zelândia, 4°: Noruega, 5°: Cingapura
- 178°: Síria, 179°: Venezuela, 180°: Somália
Tráfico de armas (Global Organized Crime Index, 2023)
- 1°: Iemen, 2°: Afeganistão, 3°: República Africana Central, 4°: Congo, 5°: Irã, 16°: Brasil
Tráfico de pessoas (Global Organized Crime Index, 2023)
- 1°: Afeganistão, 2°: Eritreia, 3°: Iêmen, 4°: Burundi, 5°: Cambodja, 84°: Brasil
Trabalho análogo a escravidão (Global Slavery Index, 2023)
- 1°: Índia, 2°: China, 3°: Coreia do Norte
- 178°: Suíça, 179°: Noruega, 180°: Alemanha
Crimes de flora (Global Organized Crime Index, 2023)
- 1°: Congo, em 2° posição: Brasil, China, Guiné Bissau e Gabon
- 171°: Trinidad e Tobago, 172°: Tuvalu, 173°: Uruguai
Tráfico de vida selvagem (ROUTES, 2020)
- 1°: China, 2°: Indonésia, 3°: Índia, 4°: Tailândia, 5°: Vietnã
Letalidade policial
- 1°: El Salvador, 2°: Brasil (O Globo, 2019)
Categoria Cidades
- Capitais seguras e habitáveis na América Latina: 1° Buenos Aires (Argentina), 2° Santiago (Chile), 3° Montevidéu (Uruguai) , 4° San Juan (Porto Rico), 5° Lima (Peru) (Poder 320, 2023)
- No Ranking das 50 cidades mais violentas do mundo, as 7 primeiras estão no México, em 8° posição Nova Orleans (EUA), seguidas de duas outras mexicanas e em 11° Mossoró (Brasil) (Exame, 2023)
Caso não saiba o que significa cada tipo de crime, veja o glossário que montamos abaixo.
Mercados do Crime
- Contrabando de migrantes: É um crime que envolve a obtenção de benefício financeiro ou material pela entrada ilegal de uma pessoa num Estado no qual essa pessoa não seja natural ou residente (United Nations Convention against Transnational Organized Crime and the Protocols Thereto, 2003).
- Crimes cibernéticos: Atividade ilícita que tem como alvo ou faz uso de um computador, uma rede de computadores ou um dispositivo conectado em rede, este crime pode ter como motivação lucro, aspectos pessoais ou políticos. Pode ser via disseminação de vírus por meio de links enviados até invasões de sistemas operacionais de empresas ou governos.
- Crimes de fauna: “Matar; caçar; a utilização de animais silvestres sem a devida permissão; o ato de exportar para exterior peles, couros e répteis brutos sem autorização; a introdução de espécies no país, salvo em casos de autorização; praticar maus tratos, abuso, ferir ou mutilar qualquer animal independente de sua espécie; e qualquer ato que provoque o perecimento da fauna aquática; para a caracterização do delito, não se faz necessário o dano físico.” (Jusbrasil)
- Crimes de flora: “Danificar ou destruir floresta considerada de preservação permanente, bem como a vegetação, seja ela primária ou secundária; Causar dano às unidades de conservação; Provocar incêndio em mata e floresta; Fabricar, vender ou soltar balões que possam causar incêndios; Extrair da floresta qualquer espécie de minerais, sem a devida autorização; Cortar e transformar em carvão madeira de lei, bem como receber e adquirir para fins comerciais ou industriais, produtos de origem vegetal sem licenciamento; Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação.” (Lei de Crimes Ambientais)
- Crime organizado: “Crime cometido por organizações criminosas, dentro de uma estrutura hierarquizada e funcionalizada.” (Jusbrasil). O crime organizado se manifesta de várias formas e atividades, desde tipos tradicionais de organizações criminosas até redes transnacionais, na maioria das vezes tem o seu lucro obtido de mercado ilícitos, como do narcotráfico e tráfico de armas.
- Crimes financeiros: Envolve o uso de recursos financeiros ou o sistema financeiro para obter ganhos indevidos, enganar pessoas, empresas ou o governo, ou prejudicar a integridade do sistema financeiro como um todo. Neste inclui-se fraude, lavagem de dinheiro, corrupção, insider trading e fraude de seguros (Minds).
- Trabalho análogo a escravidão: Na legislação brasileira, o artigo 149 do Código Penal prevê os elementos que caracterizam a redução de um ser humano à condição análoga à de escravo, são eles: a submissão a trabalhos forçados ou a jornadas exaustivas, a sujeição a condições degradantes de trabalho e a restrição de locomoção do trabalhador (Conselho Nacional do Ministério Público).
- Tráfico de armas de fogo: Crime que consiste na venda, compra, entrega, montagem e adulteração ilegal de armamento, incluindo armas de fogo, munições e explosivos (Lei N° 10.826/ 2003).
- Tráfico de pessoas: Caracterizado pelo “recrutamento, transporte, transferência, abrigo ou recebimento de pessoas, por meio de ameaça ou uso da força ou outras formas de coerção, de rapto, de fraude, de engano, do abuso de poder ou de uma posição de vulnerabilidade ou de dar ou receber pagamentos ou benefícios para obter o consentimento para uma pessoa ter controle sobre outra pessoa, para o propósito de exploração” (Protocolo Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças).
- Tráfico de drogas/Narcotráfico: Termo relacionado com a proibição de qualquer tipo de venda, compra, produção, armazenamento, entrega ou fornecimento, mesmo que gratuito, de determinadas substâncias ilícitas, dentro de cada jurisdição pode variar entre uma gama de identificações como narcóticos, ópios, tóxicos, drogas, entorpecentes, alucinógenos, psicoativos, psicotrópicos, entre outros. Cada penalidade do crime varia de acordo com o tipo da substância (Lei nº 11.343/ 2006).
Tipologia da Violência
Além dos crimes citados acima, também há a categorização da violência. De acordo com autores da área, é possível definir violência de diversas formas. Uma definição bem difundida é a da Organização Mundial da Saúde (OMS), que define a violência como:
O uso de força física ou poder, em ameaça ou na prática, contra si próprio, outra pessoa ou contra um grupo ou comunidade que resulte ou possa resultar em sofrimento, morte, dano psicológico, desenvolvimento prejudicado ou privação.
Especialistas explicam que o “uso da força fisíca ou poder” nesta definição, inclui negligência e todos os tipos de abuso físico, sexual e psicológico, bem como o suicídio e outros atos auto-infligidos. Tal explicação traz os outros tipos de violência que não necessariamente produz sofrimento ou morte, mas que, apesar disso, impõe “um peso substancial em indivíduos, famílias, comunidades e sistemas de saúde em todo o mundo.” (Dahlberg; Krug, 2006).
A OMS estabelece uma tipologia de três grandes grupos segundo quem comete o ato violento: violência contra si mesmo (autoprovocada ou auto infligida); violência interpessoal (doméstica e comunitária); e violência coletiva (grupos políticos, organizações terroristas, milícias).
Também, há com distonções da natureza da violência, divididos em nove grupos: Violência Física; Violência Psicológica/Moral; Tortura; Violência Sexual; Tráfico de seres humanos; Violência Financeira/Econômica; Negligência/Abandono; Trabalho Infantil e Violência por Intervenção legal.
Entenda todas estas definições aqui!
Anualmente, o Atlas da Violência, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), lança um relatório atualizando os dados de violência no Brasil. No trabalho feito em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), há dados sobre violência de acordo com qual grupo ou pessoa ela é direcionada. Como violência contra pessoas negras, contra crianças e adolescentes, contra a comunidade LGBTQIAP+, contra pessoas com deficiência, contra idosos, contra a mulher (inclui-se violência física, psicológica, moral, sexual e patrimonial), contra indígenas, etc.
*Este texto faz parte de uma série de conteúdos produzidos pela Rede Juntos, chamada de Novos Caminhos para a Segurança Pública, a fim de trazer maior conhecimento sobre uma temática tão ampla e desafiadora: a Segurança pública. Não deixe de acessar o site para não perder o próximo conteúdo da série!
E aí, gestor! Você tinha conhecimento de todos estes crimes e violências? Conta para a gente nos comentários abaixo. Não esqueça de avaliar o texto com estrelinhas também!
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