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Influência das Interconexões Climáticas no Regime de Chuvas: Estudo da Bacia Hidrográfica do Guandu (pt.2)

Publicado em: 20.08.24 Escrito por: Marcelo Danilo da Silva Bogalhão Tempo de leitura: 10 min Temas: Meio ambiente e Sustentabilidade
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Climatologia da Região Sudeste

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2006) a região Sudeste do Brasil se configura como uma das mais diversificadas em relação ao clima, dentre as regiões brasileiras sua localização latitudinal está entre 15° e 25° e longitudinal estendendo-se pela zona costeira atlântica até aproximadamente 1.000 Km de distância do mar  tendo grandes variações altimétricas e disposições de relevo, a localização da região Sudeste está em quase sua totalidade na região tropical exceto uma pequena faixa no sul do estado de São Paulo entre as latitudes 14° e 25° sul, Figura 5.

Figura 5 – Região Sudeste do Brasil

Fonte: IBGE, (2006)

Possuindo 14 subtipos de climas regionais Tabela 1, tendo como critérios básicos as temperaturas médias e regime pluviométrico sendo os tipos climáticos agrupados em três grandes conjuntos: 

Climas Quente, subdivididos em 5 variações considerando distribuição pluvial: 

  • Super-Úmido, sem estação seca; 
  • Úmido, variando de 1 a 3 meses secos;
  • Semi-Úmido, variando 4 a 5 meses secos
  • Semi-Árido, com até 6 meses secos;

Clima Subquente, possui temperaturas médias ligeiramente inferiores, ocasionados pelo efeito da altitude, e características pluviométricas semelhantes sendo:

  • Super-Úmido, variando de Sub-Seca à Sem Seca;
  • Úmido, variando de 1 a 3 meses secos;
  • Semi-Úmido, variando de 4 a 5 meses secos;

Clima Mesotérmico Brando, localizados em áreas mais elevadas, cujas temperaturas são brandas e há uniformidade na distribuição de chuvas sendo:

  • Super-Úmido, variando de Sub-Seca à Sem Seca;
  • Úmido, variando de 1 a 3 meses; 

Tabela 1 – Tipos Climas da Região Sudeste

  Super-Úmido Úmido Semi-Úmido Semi-Árido
QUENTE Sub-Seca 1 a 2 meses secos 3 meses secos 4 a 5 meses secos 6 meses secos
SUBQUENTE Sub-Seca Sem seca 1 a 2 meses secos 3 meses secos 4 a 5 meses secos  
MESOTÉRMICO BRANDO Sub-Seca Sem Seca 1 a 2 meses secos 3 meses secos  

Fonte: autor, adaptado de IBGE, (2006)

Neto (2005), traz a rediscussão da climatologia regional do Sudeste brasileiro desta forma propôs um decálogo usando como estratégia dez mandamentos (ou dez características) dos fatores e dinâmicas fundamentais que explicam sua gênese com o objetivo de caracterizar a natureza dos fenômenos naturais buscando explicação da diversidade existente de climas regionais fazendo ampla pesquisa bibliográfica partindo dos estudos iniciados por Edmon Nimer na década de 1970 geógrafo do IBGE e que havia feito longos estudos dos climas regionais do Brasil entre as décadas de 1940/1950, Figura 6.

Neste longo período, entretanto muitas foram as descobertas de processos e interconexões da dinâmica atmosférica trazendo novas perspectivas para a compreensão dos climas regionais como por exemplo as influências do El Niño/La Niña (NETO, 2005).

Figura 6 – Tipos Climáticos da Região Sudeste

Fonte: IBGE, (2006)

Teleconexões Climáticas 

Para a melhor compreensão da precipitação pluviométrica na região sudeste é necessário considerar os processos atmosféricos em diferentes escalas de tempo (ALVES et al. 2002) como podemos observar dois desses fenômenos climatológicos globais El Niño/La Niña que impactam a região sudeste do Brasil, Figuras 7,8, 9 e 10.

Analisar a influência de teleconexões globais que possam interferir na variabilidade climática da América do Sul e significantemente na região sudeste onde está localizada a Bacia Hidrográfica do Guandu – RH II (Rio de Janeiro – Brasil) entre os quais: ENSO (El Niño – Southern Oscilation), fenômeno de aquecimento das águas do oceano Pacífico Equatorial Leste e La Nina (ocorrência do mesmo fenômeno mas sendo o inverso o esfriamento das águas do oceano Pacífico Equatorial Leste), e que alteram o ciclo hidrológico na América do Sul mudando os padrões de ventos globais influenciando o regime de chuvas em regiões tropicais e latitudes médias.  

Figura 7 – Fenômeno do El Niño (Período – Dez, Jan e Fev)

Fonte: CPTEC/INPE, (2021).

Figura 8 – Fenômeno do El Niño (Período – Jun, Jul e Ago)

Fonte: CPTEC/INPE, (2021).

Figura 9 – Fenômeno do La Niña (Período – Dez, Jan e Fev)

Fonte: CPTEC/INPE, (2021).

Figura 10 – Fenômeno do La Niña (Período – Jun, Jul e Ago)

Fonte: CPTEC/INPE, (2021).

Recentemente tivemos comprovadamente ocorrência de El Niño entre 2014 e término em 2016 sendo considerado o segundo mais forte já registrado na história do fenômeno climático provocando estiagens e seca afetando diretamente lavouras e a produção de alimentos no Nordeste assim como para a região Sudeste causando aumento de temperatura afetando o volume hídrico dos reservatórios das grandes capitais São Paulo e Rio de Janeiro, estudos já apontam para os efeitos do El Niño sobre a precipitação da região Sudeste no entanto estudos mais específicos em relação as bacias hidrográficas são sugeridos.

Outro fenômeno que possui intervalo de ocorrência mais prolongado e que pode influenciar o clima em regiões distantes a ODP (Oscilação Decadal do Pacifico) teve poucos estudos realizados embora tem-se conhecimento de alguns impactos conhecidos para a América do Sul (PRADO, 2010), o fenômeno é semelhante aos eventos do El Niño e La Niña (ENSO) pois se tratam de variações de temperaturas da superfície da água do Oceano Pacífico  com variação climática um pouco mais longa com cerca de 20 anos de duração enquanto o ENSO costuma durar entre 6 a 18 meses, Rebello (2013) em seu estudo consegue associar a influência do fenômeno da ODP em estudo inédito nas cheias e secas ocorridas na Amazônia ocidental combinadas com ocorrência de (ENSO) sendo as mais recentes cheias entre 2009 e 2012 e as secas de 2005 e 2010. 

Prado (2010) faz levantamento de anomalias de precipitação entre 1901 a 2007 para o estado de São Paulo afim de identificar anomalias de ODP notando relação entre eventos de ENSO e fases de ODP sendo percebido em todo Estado de  São Paulo principalmente na primavera e no verão, já Neto (2005) nos traz a importância em rediscutir a climatologia para o sudeste brasileiro, como estratégia de uma nova readequação climatológica para a região, considerando os diversos fenômenos globais como a Oscilação Decadal do Pacífico (ODP) Figura 11 e 12, e que impactam diretamente algumas regiões do Brasil.

Figura 11 – Anomalia da ODP

Fonte: Site Skepticalscience, (2021).

  Figura 12 – ODP (Oscilação Decadal do Pacifico)

Fonte: Glaúcia, 2020 (adaptado de NOOA).

Marengo (2001) aborda que não há estudos regionais detalhados que apontem conclusivos indicadores de mudanças de clima e que identifiquem aquecimento regional, considerando portando que há mudanças na circulação da atmosfera para a região sudeste, Lima, Satymuraty e Fernandez (2010) destacam que os grandes fenômenos climáticos globais afetam a precipitação na região sudeste do Brasil, compreendendo que as mesmas ocorrem em períodos e durações distintas. 

Estudo de Bombardi e Carvalho (2008) menciona outro fenômeno de extrema importância para o clima da América do Sul e que provoca variabilidade da Temperatura da Superfície do Mar (TSM) sobre o Oceano Atlântico e que também pode influenciar de maneira significativa o clima do continente o Dipolo do Atlântico (TSAI/TNAI) esse fenômeno é capaz de causar variações de precipitações no Norte e Nordeste do Brasil e inclusive na África, já Enfield et al., (1999); Menezes e Brito (2010) apontam a localização da ocorrência do fenômeno para o Atlântico Sul Tropical (TSAI) anomalia do TSM na área do Equador a 20°S e 10°E-30W e ocorrendo em determinado momento no Atlântico Tropical Norte (TNAI) anomalia da TSM na área de 5°N-23,5°N e 15°W-57,5°W cabendo maior aprofundamento da influência do fenômeno para a região Sudeste, as Figuras 13 e 14 mostram as ocorrências de TNAI/TSAI para o período de 1948 a 2019.

Figura 13 – Dipolo do Atlântico Norte – TNAI

Fonte: Glaúcia, 2020 (adaptado de NOOA).

Figura 14 – Dipolo do Atlântico Sul – TSAI

Fonte: Glaúcia, 2020 (adaptado de NOOA).

Assis et al. (2018) verificam que realmente a ocorrência do fenômeno do Dipolo do Atlântico sobre a região Nordeste do Brasil é muito influenciada e que para a região Sudeste do Brasil os estudos não são conclusivos sobre a precipitação demandando ampliação de estudos, já Gláucia (2020) não verifica uma alteração para o Estado de Minas Gerais em relação ao TNAI/TSAI para a região.

Hastenrath e Hellen (1977) confirmam em seu estudo de extremos seco/chuvoso no período de 1912-1972 uma grande área de anomalia positiva de TSM na bacia norte do Atlântico Tropical e negativa na bacia sul para os meses de março-abril a anomalia de TSM (°C) para os meses de março-abril (estação chuvosa) de 1979 a 2013 na fase positiva (à esquerda) Norte e negativa (à direita) Sul para a ocorrência do Dipolo sobre o Atlântico Tropical, Figura 15.

Figura 15 – Anomalia do Dipolo do Atlântico Tropical Norte/Sul

Fonte: Lima Filho, (2016).

Evidencia-se a ocorrência do Dipolo do Atlântico Tropical (positivo) tanto para Norte quanto para Sul e em sua maioria estudos estão mais direcionados para as regiões Norte/Nordeste, observo que existe a ocorrência do fenômeno do Dipolo do Atlântico Tropical (positivo) também para o Atlântico Sul quando a anomalia é negativa no Atlântico Norte conforme podemos observar na Figura 15 (acima) imagem a esquerda e Figura 16 (abaixo) na fase negativa para Norte (à direita) e positiva para Sul evidenciando a ocorrência do Dipolo sobre o Atlântico Tropical (Sul) o que sugere uma maior investigação dos efeitos dessa anomalia para as regiões Sudeste/Sul.

Figura 16 – Anomalia do Dipolo do Atlântico Tropical Norte/Sul 

Fonte: Lima Filho, (2016)

Em estudo recente Silva (2018) em suas análises se utilizando de índices SPI (Standard Precipitation Index) e SPEI (Standard Precipitation Evapotranspiration Index) identifica frequência de secas no centro-sul da região Sudeste do Brasil caracterizada por três regiões metropolitanas: São Paulo, Campinas e Belo Horizonte a região sul de Minas Gerais (Lavras) e a região centro-leste de São Paulo (Piracicaba), os resultados evidenciaram que o período entre 2013 e 2015 foi o mais seco já observado para a região Sudeste do Brasil sendo anos consecutivos de volumes baixos de precipitação e com elevadas temperaturas.

Já em 2014 o Plano Estadual de Recursos Hídricos do Estado do Rio de Janeiro (PERHI-RJ) aprovado pelo Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERHI-RJ), apresenta um panorama geral de disponibilidade e demandas hídricas no Estado do RJ em um horizonte até 2030, sendo ainda destacado a forte dependência do Estado do Rio de Janeiro em relação à Bacia do Rio Paraíba do Sul, sendo compartilhada com outros 184 munícipios divididos pelos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, observa-se para a Região Hidrográfica do Guandu que a principal demanda do recurso hídrico se encontra no setor industrial seguido pelo abastecimento humano (PERHI, 2014).

 

Observações
Este texto faz parte de um artigo completo escrito pelo autor. O artigo agora está subdividido em 3 partes na plataforma Rede Juntos, para conferir o restante acesse aqui.


*Esse conteúdo pode não refletir a opinião da Comunitas e foi produzido exclusivamente pelo especialista da Nossa Rede Juntos.

Artigo escrito por: Marcelo Danilo da Silva Bogalhão
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