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O desafio do Equilíbrio Fiscal no último ano de mandato e ano eleitoral

Publicado em: 03.05.24 Escrito por: Fúlvio Piccinini Albertoni Tempo de leitura: 11 min
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O equilíbrio fiscal na gestão pública passa pelo planejamento, execução, transparência e controle, observadas as normas legais, o comprometimento do gestor e uma equipe técnica qualificada, proporcionando a qualificação do gasto público.

A busca pelo equilíbrio fiscal se inicia antes mesmo dos eleitos tomarem posse, pois esse equilíbrio já deve estar previsto no Plano de Governo do candidato, que contemplará as ações estratégicas a serem executadas ao longo do mandato, e servirá também de base para a elaboração do Plano Plurianual (PPA), no qual se definem programas, indicadores, metas, ações, resultados e fontes de recursos de médio prazo, e que são transformados no planejamento anual por meio da Lei de Diretrizes Orçamentária e Lei Orçamentária Anual, e sua execução e controle orientado pelas normas instituídas na Lei n.º 4.320/1964.

Já a transparência e o controle fiscal seguem os mecanismos da Lei de Responsabilidade Fiscal, um instrumento legal que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal, que pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas.

Nessa definição, fica claro que a responsabilidade na gestão fiscal se baseia no equilíbrio entre as receitas e as despesas públicas, tendo como princípio o planejamento das ações e a transparência das mesmas, por parte de cada ente público. Define também limites para evitarem riscos capazes de afetar as contas públicas, e caso esses sejam ultrapassados, indica as providências que deverão ser adotadas no prazo estipulado para corrigir estes riscos fiscais.

Porém, 2024 é um ano atípico para as administrações municipais, pois além do cumprimento normal das normas de planejamento, execução, transparência e controle, por ser ano eleitoral e, também, o último ano de mandato dos atuais gestores, existem outros limites e vedações legais que devem ser observados.

Essas limitações prioritariamente estão contidas na Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF (Lei Complementar nº 101/2000) e Lei Eleitoral (Lei nº 9.504/1997), dentre outras normas legais, que impõem aos gestores públicos municipais um desafio adicional para a obtenção do equilíbrio fiscal das contas públicas municipais.

Mas, porque existe uma ampliação de exigências e controle mais rígido das finanças públicas para o ano de 2024?

No caso da LRF, além da busca e manutenção do equilíbrio fiscal, traz também restrições ao último ano de mandato do chefe do poder executivo local, com o intuito da não utilização de recursos públicos que possam influenciar no pleito eleitoral. Mas, principalmente, para não criar ou ampliar despesas no final da administração, que possam comprometer as contas públicas da gestão atual, além de impactar negativamente na nova gestão que se iniciará no exercício seguinte.

Já na Lei Eleitoral, que estabelece normas para as eleições, inclusive das condutas vedadas aos agentes públicos em campanhas eleitorais, o intuito é evitar a utilização de recursos públicos ou o cargo que ocupa para promover ações que possam afetar a igualdade de oportunidades entre os candidatos.

Para ilustrar esses limites e vedações listamos nos Quadros I e II as principais restrições fiscais dispostas nas legislações acima citadas, com seus respectivos fundamentos legais e prazos.

QUADRO I | LIMITES E VEDAÇÕES PREVISTOS NA LEI COMPLEMENTAR N.º 101/2000, LEI N.º 4.320/1964 E RESOLUÇÃO N.º 43/2001 DO SENADO FEDERAL – PARA ÚLTIMO ANO DE MANDATO – A DATA DA ELEIÇÃO EM 06/10/2024 (1º DOMINGO DE OUTUBRO) E FINAL DO MANDATO DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO MUNICIPAL EM 31/12/2024

ESPECIFICAÇÃO DA PROIBIÇÃO FUNDAMENTO LEGAL PRAZO
1. Aumentar despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do chefe do poder executivo. Art. 21, II, da LRF A PARTIR DE 05/07/2024
2. Aumentar despesa com pessoal que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do chefe do poder executivo. Art. 21, III, da LRF POSTERIOR AO FINAL DO MANDATO
3. Aprovação, a edição ou a sanção, por parte do chefe do poder executivo, de norma legal contendo plano de alteração, reajuste e reestruturação de carreiras do setor público, ou a edição de ato para nomeação de aprovados em concurso público quando resultar em aumento da despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato ou que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo. Art. 21, IV, da LRF A PARTIR DE 05/07/2024 OU POSTERIOR AO FINAL DO MANDATO
4. Receber transferências voluntárias, obter garantia, direta ou indireta, de outro ente e contratar operações de crédito, ressalvadas as destinadas ao pagamento da dívida mobiliária e as que visem à redução das despesas com pessoal, caso a despesa total com pessoal exceder o limite de 54% (cinquenta e quatro por cento) no primeiro quadrimestre do último ano do mandato do titular do Poder Executivo. Art. 23, §4º da LRF A PARTIR DE 01/01/2024
5. Recondução da dívida aos limites no último ano do mandato do chefe do poder executivo. Art. 31, §3º, da LRF A PARTIR DE 01/01/2024
6. Realização de operação de crédito por antecipação de receita orçamentária no último ano de chefe do poder executivo. Art. 38, IV, b, da LRF e Art. 15, §2º, da Resolução n.º 43/2001 do Senado Federal A PARTIR DE 01/01/2024
7. Contratação de operação de crédito nos 120 (cento e vinte) dias anteriores ao final do mandato do chefe do poder executivo, excetuam-se o refinanciamento da dívida mobiliária e as operações de crédito já autorizadas pelo Senado Federal até 120 (cento e vinte) dias antes do final do mandato do chefe do poder executivo. Art. 15, §1º, da Resolução n.º 43/2001 do Senado Federal A PARTIR DE 02/09/2024
8. Contrair obrigação de despesa, nos dois últimos quadrimestres do mandato do Prefeito, que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa. Art. 42 da LRF A PARTIR DE 01/05/2024
9. Assumir, no último mês do mandato, por qualquer forma, compromissos financeiros para execução depois do término do mandato do chefe do poder executivo. Art. 59 da Lei n.º 4.320/1964 A PARTIR DE 01/12/2024

QUADRO II | LIMITES E VEDAÇÕES PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO ELEITORAL – LEI Nº 9.504/1997 E RESOLUÇÃO Nº 23.735/2024 DO TSE – CONSIDERANDO A DATA DA ELEIÇÃO EM 06/10/2024 (1º DOMINGO DE OUTUBRO)

ESPECIFICAÇÃO DA PROIBIÇÃO FUNDAMENTO LEGAL PRAZO
1. Ceder ou usar, em benefício de candidato, partido político ou coligação, bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta, ressalvada a realização de convenção partidária. Art. 73, I da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, I, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 01/01/2024
2. Usar materiais ou serviços, custeados pelos Governos ou Casas Legislativas, que excedam as prerrogativas consignadas nos regimentos e normas dos órgãos que integram. Art. 73, II da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, II, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 01/01/2024
3. Ceder servidor público ou empregado da administração direta ou indireta do Poder Executivo, ou usar de seus serviços, para comitês de campanha eleitoral de candidato, partido político ou coligação, durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado. Art. 73, III da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, III, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 01/01/2024
4. Fazer ou permitir uso promocional em favor de candidato, partido político ou coligação, de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo poder público. Art. 73, IV da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, IV, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 01/01/2024
5. Nomear, contratar ou, por qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens, ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvadas: a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança; b) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo; c) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do chefe do poder executivo. Art. 73, V da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, V, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 06/07/2024 ATÉ A POSSE DOS ELEITOS
6. Autorizar publicidade institucional de atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos ou das respectivas entidades da Administração indireta, com exceção da propaganda de produtos e serviços que tenham concorrência no mercado e em caso de grave e urgente necessidade pública, assim reconhecida pela Justiça Eleitoral. Art. 73, VI, b, da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, VI, b, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 06/07/2024 ATÉ 06/10/2024 OU 27/10/2024 (se houver 2º turno)
7. Fazer pronunciamento em cadeia de rádio e de televisão fora do horário eleitoral gratuito, salvo quando, a critério da Justiça Eleitoral, tratar-se de matéria urgente, relevante e característica das funções de governo. Art. 73, VI, c, da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, VI, c, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 06/07/2024 ATÉ 06/10/2024 OU 27/10/2024 (se houver 2º turno)
8. Empenhar, no primeiro semestre do ano de eleição, despesas com publicidade dos órgãos públicos federais, estaduais ou municipais, ou das respectivas entidades da Administração indireta, que excedam a 6 (seis) vezes a média mensal dos valores empenhados e não cancelados nos 3 (três) últimos anos que antecedem o pleito. Art. 73, VII, da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, VII, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 01/01/2024 ATÉ 30/06/2024
9. Fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração das servidoras públicas e dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição nos 180 (cento e oitenta) dias que antecedem a eleição até a posse das pessoas eleitas. Art. 73, VIII, da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, VIII, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 09/04/2024 ATÉ A POSSE DOS ELEITOS
10. Distribuir gratuitamente, no ano eleitoral, bens, valores ou benefícios da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, estado de emergência ou programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. Art. 73, §10, da Lei nº 9.504/97 e Art. 15, IX, da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 01/01/2024
11. Contratar shows artísticos pagos com recursos públicos, nos três meses que antecederem as eleições, na realização de inaugurações. Art. 75 da Lei nº 9.504/97 e Art. 21 da Resolução nº 23.735/2024 do TSE A PARTIR DE 06/07/2024 ATÉ 06/10/2024 OU 27/10/2024 (se houver 2º turno)

As vedações e limitações listadas nos Quadros I e II devem ser tratadas com o máximo de atenção, principalmente no que se refere aos prazos, para que o gestor no seu último ano de mandato, mesmo conseguindo o equilíbrio fiscal, não tenha a sua gestão maculada pelo descumprimento de algum desses dispositivos legais. Além das sanções que o próprio gestor pode sofrer, como multa, cassação do registro de candidatura ou diploma e suspensão dos direitos políticos.

Essas proibições também podem ser instrumentos de auxílio na obtenção do equilíbrio fiscal, pois por meio dos seus diplomas legais, é possível deter a justificativa de redução de despesas e concessões de benefícios. Sendo assim, é fundamental que o gestor observe e atenda esses regramentos, para finalizar o mandato cumprindo as exigências legais e de responsabilidade fiscal.



*Esse conteúdo pode não refletir a opinião da Comunitas e foi produzido exclusivamente pelo especialista da Nossa Rede Juntos.

Artigo escrito por: Fúlvio Piccinini Albertoni
Técnico de Nível Superior em Planejamento
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