A agropecuária sustentável na Nova Indústria Brasil
Desde o começo deste século alguns economistas desenvolvimentistas têm revisto como setores intensivos em recursos naturais podem impulsionar a complexidade econômica de seus países, sobretudo pela alta tecnologia incorporada pelo agronegócio a partir dos anos 1960/70. Antes vista como sinônimo de atraso, passou-se a ter clareza sobre o quanto ela pode induzir o surgimento de indústrias de alto valor agregado (de bioinsumos para a produção no campo até biopolímeros, e mesmo novas formas de manejo do solo), conforme demonstram Cláudio Frischtak e Luiz Gonzaga Belluzzo no primeiro capítulo de volume organizado por eles e Mariano Laplane em 2014, exclusivamente sobre como o setor primário pode levar a atividades complexas e com alto valor agregado, livro paradigmático para repensar estas atividades econômicas.
Compreender o agronegócio dentro de uma estratégia nacional de desenvolvimento torna o planejamento da atividade produtiva bem mais abrangente em relação ao território brasileiro, posto que, segundo o IBGE, mais de 60 % dos municípios do país são classificados como “municípios rurais”. Com isso, entender formas sustentáveis de atividade rural também gera impacto sobre políticas em âmbito local, tanto em relação à geração de renda quanto no planejamento urbano e intermunicipal de municípios menores, ou mesmo em regiões metropolitanas que contam com muitas cidades pequenas de alta produtividade no campo, como é o caso de Ribeirão Preto.
Tal mudança de paradigma é bastante esclarecedora para compreendermos a relevância dada à Bioeconomia na Nova Indústria Brasil – NIB, que abandona o antigo conceito de “reindustrialização” e volta-se para o de “neoindustrialização”, que não consiste apenas na retomada da indústria, mas a propõe em novos moldes, guiados pelos objetivos de sustentabilidade ambiental, econômica e social. Um sinal claro é que, das 6 missões prioritárias deste projeto interministerial liderado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços – MDIC, uma é precisamente denominada de Bioeconomia e outra pode ser vista como um ramo desta, a Agropecuária Sustentável.

Fonte: AutoData Notícias
Em fevereiro passado, 13/2, aconteceu a primeira reunião da recém criada Comissão Nacional de Bioeconomia – CNBio, instância onde deve ser elaborado o Plano Nacional de Desenvolvimento da Bioeconomia – PNDBio. Ele está previsto na Estratégia Nacional de Bioeconomia como parte fundamental da NIB, tal que a “comissão” está sendo presidida por um representante do MDIC.
Segundo Thiago Falda, doutor em genética e melhoramento de plantas pela Esalq (USP) e presidente-executivo da Associação Brasileira de Bioinovação, a implementação de uma política nacional de bioeconomia e a coordenação da complexa rede tecnológica nela envolvida tem o potencial de injetar US$ 592,6 bilhões ao ano em nossa economia, além de reduzir nossas emissões de Gases de Efeito Estufa em 28,9 bilhões de toneladas de CO2, o que inclui captura de carbono. Por isso, afirma que a coordenação desta política deverá permitir que “o Brasil ocupe uma posição de destaque na revolução industrial alavancada pela biotecnologia”, alçando o patamar já ocupado por Estados Unidos, China e os principais países europeus.
Sendo assim, o objetivo no presente artigo consiste em apresentar os elementos gerais da chamada “agricultura regenerativa”, concepção de práticas sustentáveis para o agronegócio usada na Estratégia Nacional de Bioeconomia lançada em meados do ano passado, também atualmente defendida no Sharm el-Sheikh Joint Work on Agriculture – SJWA da Conferência das Partes do Acordo de Paris e pelas principais entidades representativas da agropecuária brasileira, a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária – CNA e a Associação Brasileira do Agronegócio – Abag. Primeiro a agricultura regenerativa será contextualizada dentro da Bioeconomia e de sua estratégia nacional dentro do projeto de neoindustrialização, incluindo como CNA e Abag a defenderam em position papers no final de 2024, para depois maior detalhamento a respeito de suas principais características. Por fim, algumas considerações gerais acerca desta proposta de desenvolvimento no campo.
Se imaginarmos o quanto o agronegócio demanda nossa indústria automobilística (sobretudo de carga), de TI, farmoquímicos, naval, obras viárias e serviços financeiros, conforme demonstrou em 2018 na Carta IEDI 859 José Roberto Mendonça de Barros, ex-USP e dono de uma das primeiras consultorias no agronegócio pós-Revolução Verde, podemos ter a dimensão da capacidade das atividades rurais em alavancar outros ramos da economia. Apesar de não ter o mesmo potencial de complexidade econômica como os eletrônicos e aeronáutica, é um setor que deu certo no Brasil e, nas palavras Luis Antonio Paulino já em 2007, professor da Unesp e ex-assessor especial dos ministérios da Fazenda (2003) e da Secretaria de Coordenação Política e Assuntos Institucionais da Presidência da República (2004-2005), não dar a devida importância à forte demanda por alimentos tendo esta nossa capacidade é o mesmo que “ganhar na loteria e não ir buscar o prêmio” (página 160).
Agropecuária regenerativa na Estratégia Nacional de Bioeconomia
As duas principais entidades associativas do agronegócio nacional, CNA e Abag, apresentaram respectivos position papers para a COP29 priorizando como os fundos climáticos poderiam financiar a agricultura de baixo carbono. Para isso, concentram atenção no incentivo à produção de alimentos e biocombustíveis, conciliando a segurança alimentar e ações climáticas, e em ambos a agricultura regenerativa ganhou destaque. Como já apresentei em outra oportunidade um panorama geral de como estas questões conformam-se no âmbito da Conferência das Partes do Acordo de Paris, e a pauta aqui é como seus desdobramentos incidem sobre nossa capacidade produtiva, trataremos da forma com que estas duas entidades contextualizaram estas práticas sustentáveis.
O documento publicado pela CNA em outubro do ano passado é bastante detalhado, apresentando em tópicos pautas distribuídas em, além da introdução, na agricultura no acordo do clima, meios de implementação, meta global de adaptação, transparência e metodologias, mercado de carbono, Programa de Trabalho dos Emirados Árabes sobre Transição Justa e agenda brasileira para a COP30. Na penúltima pauta atenta para a necessidade de criação de mecanismos de financiamento e transferência de tecnologia para adoção de práticas regenerativas, focada na recuperação e manutenção da saúde do solo e uso racional da água, uma definição que será aprofundada na próxima seção.
O divulgado pela Abag no mês seguinte foca na arena internacional e em padrões internacionais de crédito, e defende que na meta brasileira tais práticas devam ocupar pelo menos 72,6 milhões de hectares, capturando até 1 bilhão de toneladas de CO2 até 2030. Segue basicamente a mesma ordem de pautas e ,talvez por pensar mais na taxonomia internacional que do que “da porteira para dentro”, nele há maior detalhamento sobre os métodos de captura de carbono e demais elementos fundamentais para a saúde do solo e retenção de água definidos como agricultura regenerativa, como “recuperação de áreas degradadas, sequestro de carbono no solo, aumento da produtividade, fixação biológica de nitrogênio, uso racional dos recursos naturais, proteção da biodiversidade, adaptação e resiliência às mudanças climáticas e gestão integrada da paisagem” (página 10).
Conforme exposto por Luciano Batista (Aston Business School – Reino Unido) em debate sobre Bioeconomia promovido pela Embrapa no último dia 27/3, os métodos regenerativos se enquadram entre os 3 pilares da Economia Circular, junto à eliminação do desperdício e maximização da utilidade de produtos. Entender a Bioeconomia dentro destes três pilares não apenas ajuda a compreender onde a agricultura regenerativa entra neste conjunto como também leva a pensar esta atividade intensiva em recursos naturais dentro de seu potencial tecnológico e comercial, nos parâmetros da Bioeconomia Biotecnológica, paradigma considerado o mais profícuo socioeconomicamente em relatório divulgado em 2023 pelo Observatório de Bioeconomia da FGV Agro, sob comando de Daniel Vargas, que foi um dos 3 palestrantes do evento.
Tanto os elementos levantados pela CNA e pela Abag quanto os debatidos no evento da Embrapa no começo do ano estão presentes na Estratégia Nacional de Bioeconomia que, como foi dito anteriormente, enumera objetivos e procedimentos para a elaboração do Plano Nacional de Desenvolvimento da Bioeconomia – PNDBio na NIB. Ela foi assinada por Lula em junho de 2024, Marina Silva, do MMA, e pelos secretários executivos do Ministério da Fazenda, Dario Carnevalli Durigan, e do MDIC, Márcio Fernando Elias Rosa. Ou seja, os três ministérios responsáveis por políticas de neoindustrialização que envolvam todos os demais, como o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA.
Na “Estratégia” define Bioeconomia como “modelo de desenvolvimento produtivo e econômico baseado em valores de justiça, ética e inclusão, capaz de gerar produtos, processos e serviços, de forma eficiente, com base no uso sustentável, na regeneração e na conservação da biodiversidade, norteado pelos conhecimentos científicos e tradicionais e pelas suas inovações e tecnologias, com vistas à agregação de valor, à geração de trabalho e renda, à sustentabilidade e ao equilíbrio climático”. O princípio da “regeneração” surge como instrumento de uso sustentável dos recursos naturais, junto à “conservação da biodiversidade, dado que aborda tanto a manutenção da “floresta é pé” como métodos produtivos capazes de regenerar a capacidade de fornecimento de serviços ecossistêmicos em áreas já sem mata nativa.
Neste contexto, enumera 13 diretrizes, sendo 4 relativas à inclusão social (V a VIII), 5 sobre o papel da pesquisa científica e inovação (IX a XIII) e as 4 primeiras sobre o manejo sustentável. Nestes sobre manejo sustentável sintetiza as atividades rurais de baixo carbono enquanto “agricultura regenerativa”, englobada “à restauração produtiva, à recuperação de vegetação nativa, ao manejo e à produção florestal sustentáveis, em especial de sistemas alimentares saudáveis”.
Em resumo, é possível afirmar que tanto no debate desenvolvimentista quanto nos norteadores da atual política de recuperação da indústria, ao se engajar em práticas regenerativas o agronegócio pode ser visto como um dos protagonistas para um desenvolvimento pautado em aprimoramento tecnológico objetivando sustentabilidade ambiental, econômica e social. Isso exige uma compreensão mais aprofundada sobre os critérios científicos que definem a concepção de agropecuária regenerativa, posto que nos documentos oficiais. órgãos governamentais e entidades representativas apenas trazem suas linhas gerais.
Práticas regenerativas no Agronegócio
Para uma primeira vista destas práticas sustentáveis que assumem a saúde do solo como âncora, nosso ponto de partida introdutório é o artigo técnico publicado por Maurício Cherubin e Martha Carvalho, da Esalq (USP), e Marcos Rodrigues, da Mosaic Fertilizantes. Nele a definem como principal pilar para a transição para uma agricultura mais sustentável, porque está baseada na recuperação dos elementos biológicos que compõem o solo, segundo principal reservatório de carbono do planeta, atrás apenas dos oceanos.
Pontuam que ao serem compostos por natureza mineral e orgânica, os organismos vivos que ocupam os espaços porosos e a superfície possuem tanto papel crucial na fertilidade quanto na regulação da ciclagem de nutrientes necessários para a vida, na manutenção da qualidade e volume da água e nas trocas gasosas. Deste modo, a recuperação dos elementos biológicos do solo também regenera a capacidade de retenção de água e a torna potável, além da enorme capacidade de capturar carbono e outras substâncias que, em estado gasoso, provocam o aquecimento global. A permanência do carbono no solo depende dos organismos responsáveis pela decomposição da matéria orgânica, tal que este processo envolve tanto estes organismos vivos quanto mortos, de modo que o carbono desempenha um papel importante na manutenção da estabilidade estrutural do solo (página 16). Por isso a recuperação de pastagens é uma das soluções mais eficazes na mitigação das mudanças climáticas e, simultaneamente, ao recuperar a capacidade produtiva no campo, em si já é uma recompensa para quem adere a tais formas de manejo.
Um trabalho que sistematiza de modo bastante pedagógico os principais critérios que definem a agricultura regenerativa é o lançado pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável – CEBDS em 2023, durante a COP 28. Resultado de três oficinas temáticas realizadas no “Conselho”, busca uma adequação do paradigma inicialmente pensado na agricultura orgânica para a agropecuária empresarial. Eles identificam na literatura acadêmica duas diferentes óticas, voltadas para diferentes enfoques, que identificam critérios diferentes: i) foco em processos produtivos, quantificando a abrangência de práticas agrícolas e de conservação da biodiversidade e ii) foco nos resultados atingidos, como emissões de GEE, aumento da biodiversidade e do volume hídrico, sendo este último ainda com poucas definições de métricas. Em relação aos processos produtivos, enumeram 10 principais que caracterizam esta forma de manejo:
- ações de cobertura do solo;
- sistemas integrados, como integração lavoura-pecuária-floresta – ILPF;
- melhoramento da qualidade do solo (capacidade de sequestro de CO2, fertilidade e biodiversidade);
- recuperação de vegetação nativa e replantio de florestas;
- rotação de culturas ou cultivo sucessivo;
- cobertura do solo o ano todo, o que ajuda a evitar a erosão;
- adoção da prática de plantio direto ou diminuição da aração de campos;
- uso otimizado e eficiente de defensivos agrícolas e biotecnologia;
- promoção de bem-estar animal e de práticas justas de trabalho para os produtores;
- adoção de biodigestores para geração de energia a partir de dejetos bovinos.
A publicação do CEBDS aponta Carlos Eduardo Cerri (Esalq – USP) como principal referência para o desenvolvimento de sua proposta, que tem inúmeros estudos sobre o tema. Em artigo recente, em que é coautor, divide-se praticamente estas mesmas práticas em dois grupos, os relacionados ao manejo do campo, como plantio direto e manutenção da cobertura ao longo do ano, e os relacionados ao dos insumos, como aplicação de nutrientes e manejo de água. Enquanto os critérios de resultados no CEBDS inicialmente parecem mais gerais, como redução de emissões e aumento da biodiversidade, e ao final do texto se tornam mais específicos, há de se considerar a falta de um padrão, e talvez por isso a apresentada pelo trabalho citado de Cerri do ano passado, surjam com maior clareza. Os critérios de avaliação de resultados seriam 7: i) razão entre carbono orgânico no solo e argila, ii) carvão ativo, iii) capacidade hídrica disponível, iv) entrada e saída de Nitrogênio no sistema agrícola implementado (System N), v) entrada e saída de fósforo no solo (System P), vi) perdas de CO2 em escala de rendimento e vii) uso de água na irrigação. Como os próprios autores do paper reconhecem, estes fatores de desempenho podem variar de acordo com o bioma, e por isso propõem uma metodologia multicritério adaptável para cada realidade; uma agenda para ser discutida na COP 30 e decidida na COP 31, de acordo com o cronograma da parceria entre FAO e UNFCCC.
Um trabalho aplicado sobre a implementação da agropecuária regenerativa que apresenta fontes de informação em nível macro foi o apresentado no Simpósio Brasileiro de Sensoriamento Remoto de 2023 por pesquisadores da FEAGRI e NIPE, da Unicamp, e Embrapa Agricultura Digital. Partem de uma concepção de práticas de regeneração mais enxuta, “maiores taxas de infiltração de água e incorporação de matéria orgânica no solo” (página 1860) para oferecer alternativas para avaliação de políticas públicas nacionais. Elegeram um sistema integrador das práticas regenerativas, a Integração Lavoura-Pecuária – ILP, usando a plataforma Rede ILPF para mapear casos de uso deste sistema no Brasil, e a MapBiomas para a avaliação dos resultados.
A Rede ILPF traz informações sobre casos de uso da Integração Lavoura-Pecuária-Floresta e só ILP, é uma parceria público-privada composta pela Embrapa, Cooperativa Cocamar, Bradesco, John Deere, Minerva Foods, Soesp, Suzano, Syngenta e Timac Agro. Ela distribui os casos por biomas, o que permite um comparativo de acordo com as condições naturais, fundamental tanto para otimizar a produtividade quanto para avaliar a sustentabilidade ambiental.
Já o MapBiomas oferece mapeamentos em nível nacional, detalhados, sobre uso do solo, regeneração, nível de carbono fixado e atividades agropecuárias ao longo do país, e apesar de não medir diretamente ILP e, no geral, agropecuária regenerativa, o cruzamento dos dados oferecidos permite prospectar onde elas ocorrem e quais os resultados. Trata-se de uma iniciativa de múltiplas instituições, que envolve desde empresas federais até universidades, empresas privadas e ONG’s brasileira e internacionais, reunidas desde 2015 pelo Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa – SEEG, do Observatório do Clima.

Fonte: MapBiomas Infográficos
Apesar de haver clareza sobre o que é a agropecuária regenerativa, que concentra os estudos de como é possível recuperar a capacidade produtiva do solo e promover as diversas formas de ciclagens fundamentais para fortalecer a estrutura da superfície, qualidade da água e sequestro de carbono, capaz de mitigar as mudanças climáticas através da recuperação dos elementos biológicos no solo, a constatação de que não existe uma métrica consensual acerca desta abordagem está em todas as fontes acadêmicas trazidas aqui. Mas, em suma, medir o resultado de suas práticas para fins climáticos gira em torno do carbono fixado, água retida, e aumento da presença de nutrientes, posto que precisa solucionar tanto problemas ambientais como a produtividade, caso contrário não atrairá engajamento dos produtores. Trata-se de um diálogo fundamental entre pesquisadores, capazes de fornecer tecnologias, e agentes públicos em esfera internacional, o que já possui arena definida na UNFCCC, e cujos primeiros resultados deverão ser apresentados na COP 31. O Brasil tem muito a oferecer nesta transformação produtiva, com práticas e produção de insumos consolidadas nos Planos ABC e ABC+ (atual RenovAgro), por isso é fundamental a agricultura sustentável estar presente na NIB.
Considerações finais sobre esta proposta de desenvolvimento no campo
No início deste último paper, elaborado pelos pesquisadores da FEAGRI, NIPE e Embrapa, ressalta-se que o crescimento populacional acelerado nas últimas décadas, sobretudo em regiões de alta vulnerabilidade socioeconômica, a demanda sobre a agropecuária para produção de mais alimentos e em preço menor levou estes atores econômicos a “uma forte pressão sobre os solos agricultáveis e maiores níveis de emissões de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera, devido, principalmente, ao emprego de práticas inadequadas de manejo agropecuário, como sistemas de monocultivo e de pastagem degradadas, ciclos mais curtos de rotação de culturas, uso excessivo de mecanização agrícola, entre outros” (página 1858). Como resultado, desencadeou “na procura constante, por parte dos produtores agropecuários, por formas mais eficientes de usos dos recursos naturais, como, por exemplo, a utilização de meios de produção que promovam o desenvolvimento sustentável” (idem).
Isso explica o motivo de a agropecuária regenerativa ser defendida por entidades representativas como CNA e Abag, que enxergam esta demanda em nível internacional não apenas como negociação para fontes de financiamento, mas como vértice para a desconstrução da demonização do setor. Aliás, o position paper da Abag recorre a dados do estudo do Environment Program das Nações Unidas publicado em 2024, demonstrando que a principal fonte de emissões de GEE no mundo é a produção de energia elétrica (15,1GtCO2e), seguida pelo transporte (8,4GtCO2e), e só depois vem a agropecuária e indústria (6,5GtCO2e), atestando que não estamos falando do principal “vilão” do aquecimento global.
Ou seja, o engajamento em práticas sustentáveis está surgindo nos produtores rurais pela percepção deles mesmos, e isso envolve o estímulo ao surgimento de novas tecnologias e industrias, algo muito bem explicado em artigo publicado em 2018 por Saleem Ali (Center for Energy and Environmental Policy – University of Delaware) e Jose Puppim de Oliveira (Centro de Estudos do Novo Desenvolvimentismo – FGV), que deve ser retomado em contribuições futuras minhas neste mesmo espaço. É mais que justificada a mudança de posicionamento entre alguns economistas oriundos do debate cepalino, como Belluzzo e Paulino, em relação ao papel do agronegócio em uma política industrial e no desenvolvimento do país em geral.
Pensar a agropecuária em seu uso intensivo de tecnologia sustentável em seus processos produtivos também ajuda a compreender como esta atividade promove a familiarização e o engajamento à inovação de uma forma geral em áreas distantes dos grandes centros, nos chamados municípios rurais. Isso tem por consequência tanto o aumento da produtividade do trabalho (e consequente aumento da renda) como introduz a estas populações a importância da pesquisa científica, tornando-a apta a usar seus resultados e mesmo atraindo seus jovens para as universidades, sem que eles precisem atuar profissionalmente fora do mundo onde foram criados.
Também é importante frisar que o Brasil, país simultaneamente competitivo no Agro 4.0 mas de renda média (diferente de outras potencias agropecuárias, como Estados Unidos e Canadá), tem em mãos tanto prestígio internacional muito em virtude de sua lideranças na pauta da sustentabilidade quanto devido à sua forte capacidade de articulação dentro do G77 + China, institucionalização do chamado “Sul Global”. Estamos em uma condição privilegiada para dar “nome aos bois”, algo urgente, que claramente sabe-se que promove o desenvolvimento.
*Esse conteúdo pode não refletir a opinião da Comunitas e foi produzido exclusivamente pelo especialista da Nossa Rede Juntos.
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