Como Pelotas reduziu a violência e melhorou a frequência escolar de jovens em vulnerabilidade

Circulo de cadeiras com diversas mulheres conversando

Foto por Prefeitura Municipal de Pelotas (RS)

Introdução

Em um contexto onde a violência dentro das salas de aula é cada vez mais frequente, faz-se necessário a adoção de programas de prevenção para crianças e adolescentes em situação de risco.

 

O Cada Jovem Conta foi um dos programas pioneiros do Pacto Pelotas pela Paz, conjunto de estratégias desenvolvidas em parceria com a Comunitas e o Instituto Cidade Segura para a redução da criminalidade a partir de ações movidas por toda a sociedade no município. 

 

Iniciado em 2017 (juntamente com o Pacto Pelotas pela Paz), o projeto inspirado em uma iniciativa similar realizada em Canoas (RS), se predispôs a organizar ações entre Secretarias para identificação e acompanhamento de crianças e adolescentes em situação de risco para a violência.

 

Desafio

Em 2003, Pelotas era considerada uma cidade universitária tranquila e praticamente isolada da epidemia da violência, com uma estatística de, em média, seis homicídios para cada cem mil habitantes. Em pouco mais de dez anos, no entanto, o município rapidamente mergulhou no cenário de violência e ultrapassou 30 homicídios por cem mil habitantes em 2015, um aumento de 488%. 

 

O programa Pacto Pelotas pela Paz implementou ações em cinco grandes eixos: policiamento e justiça; tecnologia; prevenção social; fiscalização administrativa e urbanismo.

  • Eixo Policiamento e Justiça: prevê a integração das forças de segurança e foco de todos os atores na redução dos homicídios.
  • Eixo de Tecnologia: prevê o aumento das ferramentas tecnológicas, como câmeras de vigilância na cidade e o aperfeiçoamento do centro de monitoramento integrado.
  • Eixo de Prevenção Social: inclui programas de prevenção, secundária e terciária, que vão desde antes do nascimento, com o programa de Prevenção de Gravidez Precoce até a ressocialização do apenado com o projeto Segunda Chance, passando por uma reformulação do olhar sobre o jovem em um local crucial: a escola.
  • Eixo de Fiscalização Administrativa: inclui a estruturação de um novo Código de Convivência para a cidade e a realização de Operações de Fiscalização Integradas na cidade, que têm impactado todos os indicadores de violência, em especial a sensação de segurança na cidade.
  • Eixo de Urbanismo: contempla ações e regulamentações urbanísticas necessárias para tornar a cidade menos favorável à violência

 

O projeto Cada Jovem Conta, sobre o qual falaremos mais detalhadamente a seguir, se enquadra no Eixo de Prevenção Social do Pacto Pelota pela Paz. 

 

Estratégia

Para implementar o Cada Jovem Conta, foi feito um mapeamento dos homicídios na cidade em 2017, que mostrou que tanto os principais autores, como as principais vítimas, eram jovens entre 16 e 29 anos. Esses jovens tinham acabado de sair da escola, e a prefeitura encarou como uma obrigação iniciar um projeto que oferecesse todo o suporte possível para que os mesmos permanecessem na escola, com uma boa condução dos estudos. 

 

Em sua primeira fase, o Programa foi organizado através de Comitês Territoriais (CT), nas localidades mais violentas da cidade, buscando identificar crianças e jovens que apresentassem fatores de risco e que pudessem ser cooptados pelo crime, buscando diminuir a evasão ou baixa frequência escolar

 

Inicialmente, optou-se por começar com dois Comitês Territoriais (CT), que atuaram com duas escolas de cada uma dessas localidades mapeadas. De cada uma das quatro escolas selecionadas, foram escolhidos 10 alunos para entrarem no programa Cada Jovem Conta, porém as famílias não foram abordadas e nem informadas sobre a inclusão do aluno no programa. Tal decisão deu-se, principalmente, por dois motivos: 

  • Evitar a estigmatização do aluno e do programa;
  • A criança e/ou adolescente não pode e nem deve ser alienado do serviço de atenção primária básica, ou seja, qualquer intervenção feita pela equipe do Cada Jovem Conta era respaldada pelo direito da criança e do adolescente.

 

Os CTs criados contaram com a participação de membros das secretarias de Educação, Saúde e Assistência Social para atuar em quatro escolas das localidades identificadas como mais violentas, que selecionaram 40 alunos para serem incluídos no Programa

 

mulheres em volta de uma mesa branca escrevendo em cadernos

Foto por Prefeitura Municipal de Pelotas

 

Com o sucesso da iniciativa, foi desenvolvida uma estratégia de se realizar um acompanhamento unificado, por meio de um Comitê Gestor, com ações integradas entre as três secretarias (Educação, Saúde e Assistência Social) que fazem triagem e assistência por todo o programa. O time se reúne quinzenalmente para discutir caso a caso e deliberar quais ações serão tomadas mediante a situação encontrada. Após a deliberação feita pelo Comitê Gestor, os casos escolhidos são enviados para os CTs que, a partir daí, dão encaminhamento com a inclusão dos alunos no programa.

 

Ferramenta

Sispaz

O Sispaz é uma plataforma de monitoramento online com informações dos programas “Cada Jovem Conta” e “Escola da Paz” que foi iniciado em 2019.

 

Desenvolvido para professores e coordenadores acompanharem a frequência e a conduta escolar dos jovens, o sistema também permite o registro de fatores de risco familiares ou de vulnerabilidade social, considerados pontos críticos para o favorecimento da cultura da violência numa sociedade. 

 

Em 2022, o Sispaz se tornou uma rede, interligando informações de secretarias como Educação, Saúde e Assistência Social de Pelotas, possibilitando o mapeamento e monitoramento de atividades, como o envolvimento em situações de risco, que permitem ao sistema calcular o nível de risco para uma possível cooptação pela violência e apresentar os alunos que precisam de mais atenção da rede de apoio. Além disso, a ferramenta também vai apoiar o município gaúcho para o enfrentamento da evasão escolar, que é um dos maiores desafios dentro da prevenção social e segurança pública.

 

Resultados

Desde que foi implementado, há seis anos, o programa já acompanhou cerca de 400 estudantes, e dentre os casos, 70% apresentaram melhora na frequência escolar e 86% de evolução no comportamento dentro da escola.

 

Esta melhoria levou a prefeitura, em 2018, a expandir o programa para outros territórios e instituir outros 10 CTs na cidade, cobrindo um total de 40 escolas e continuando com a seleção de 10 alunos por unidade escolar. Diferentemente dos dois primeiros CTs, que tiveram acompanhamento integral da equipe da prefeitura no primeiro ano de programa, os CTs que foram resultado da expansão passaram por processos formativos de dois meses, capacitando a equipe que iria compor os Comitês e depois recebiam apoio pontual, quando solicitado e/ou necessário. 

 

Além disso, com o bom desempenho do programa em Pelotas, o Cada Jovem Conta já começou a ser replicado em outras cidades, como em Lajeado, no Rio Grande do Sul.

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