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Como a utilização de indicadores pode contribuir com as políticas de superação da pobreza?

Publicado em: 18.07.22 Escrito por: Vivian Satiro Tempo de leitura: 5 min
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A máxima do Professor Peter Drucker (1998): “se você não pode medir, não pode gerenciar”, presente na maior parte dos manuais de Administração e repetida como mantra em diversas organizações, ainda não encontra eco na formulação e implementação de diversas políticas públicas. O registro de dados, a criação de indicadores e a cultura de avaliação são processos timidamente disseminados na gestão pública. Parte pela ausência de capacidades estatais nos mais diferentes entes e órgãos; parte pela cultura da execução – que privilegia a prestação de serviços ao seu planejamento -, parte, ainda, pela má gestão dos talentos e alocação equivocada dos profissionais.

O registro dos dados é o início do processo de sistematização das informações, necessário para o monitoramento das atividades e programas, a criação de historicidade – permitindo desta forma a comparação entre períodos e objetos – a criação de projeções de atendimento e o replanejamento, quando necessário. Na política educacional, por exemplo, é fundamental registrar o número de alunos, seus dados pessoais, seus dados escolares etc.

A documentação dos dados é etapa importante da implementação das políticas públicas e deve ser tratada como tal e não como obrigação burocrática desprovida de razão.A respeito da importância dos indicadores, Jannuzzi (2006) nos ensina que tratam-se de medidas quantitativas com significado substantivo, ou seja, são números que falam por si, que refletem um conceito, contam histórias e reproduzem a realidade.

Normalmente são obtidos por meio do cruzamento de mais de uma variável. Seguindo no exemplo da política educacional, podemos citar como indicadores as taxas de analfabetismo e de distorção idade-série e a proporção de crianças matriculadas em escolas públicas; os mesmos codificam a realidade em um número, lêem determinado período e fenômeno e os sintetizam em um signo. São importantes na etapa de qualificação e seleção de problemas públicos e na elaboração de respostas, no formato de políticas públicas, a estas questões (Secchi, 2013).

Já o processo de avaliação, como parte integrante do ciclo da política pública, é a ferramenta utilizada para verificar a eficiência, a eficácia e a efetividade do Estado em ação. Tal processo identifica as possibilidades de aperfeiçoamento e as alterações de rumos necessárias.

Mas o que essa discussão tem a ver com o tema-título deste artigo?

Para Machado (2022), a superação da pobreza pressupõe a aproximação com o ambiente no qual ela reside e se desenvolve, e o primeiro passo para isso – para a focalização das políticas públicas – é a análise dos indicadores por localidade. No final de 2022, a Rede Nossa São Paulo, organização da sociedade civil, fundada em 2007 na cidade de São Paulo, lançou mais um Mapa das Desigualdades, o Desigualtômetro.

O mapa, com edições desde 2012, apresenta, de forma comparada, diferentes indicadores dos 96 distritos da capital paulista. A pesquisa, de acordo com a própria organização, reúne dados gerados pela Prefeitura Municipal em seus canais de transparência e fornecidos via Lei de Acesso à Informação (LAI). Parcela significativa dos dados podem ser encontrados no Observatório de Indicadores da Cidade de São Paulo, que apresenta, também, painéis interativos.O município de São Paulo possui mais de 12 milhões de habitantes (IBGE, 2021), uma nação em si, e apresenta inúmeras discrepâncias socioespaciais ao longo de seu território. Neste caso, mais do que olhar os indicadores da cidade em relação às demais capitais mundiais, entes subnacionais ou municípios vizinhos, é indispensável conhecer as diferentes realidades interterritoriais.

Embora o Mapa das Desigualdades não apresente a nomenclatura “pobreza” em seus indicadores estritos, os conceitos são claramente interrelacionados, sobretudo, porque aqui consideramos a definição de pobreza adotada pelo PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e inspirada no prêmio Nobel de Economia, Amartya Sen, sobre a qual considera-se pobreza um fenômeno multidimensional, que impede o acesso a liberdades e direitos e a satisfação de necessidades básicas e o exercício da cidadania.

Os indicadores do Mapa das Desigualdades estão organizados em 12 temas: demografia, habitação, mobilidade, infraestrutura digital, trabalho e renda, saúde, educação, cultura, esporte, direitos humanos, segurança pública e meio ambiente; e classificam os distritos paulistanos no formato de ranking para cada um dos 56 indicadores utilizados.

Alguns dados chamam atenção e revelam os pontos de concentração de pobreza e a desigualdade social na extensão da cidade de São Paulo. Enquanto o distrito do Jd. Ângela tem 60% de população negra (pretos e pardos), no distrito de Moema este recorte é de apenas 5,8%; dez vezes menos. A proporção estimada de domicílios em favelas sobre o total de domicílios por distrito, no Alto de Pinheiros, Jardim Paulista e Moema é igual a zero, enquanto no distrito de Vila Andrade passa dos 30%.

As desigualdades nas áreas de saúde, educação e acesso a serviços públicos, infelizmente, seguem a mesma linha, com os distritos periféricos ocupando as últimas posições das tabelas.A observação e análise desses indicadores podem contribuir com a gestão e o planejamento municipal no que tange à formulação de políticas e programas públicos de superação da pobreza, além de explicitar os problemas públicos mais proeminentes por região da cidade. É fundamental que a Administração Pública incorpore a cultura de dados e o uso de evidências para a tomada de decisão. Não basta apenas saber onde se quer chegar, é preciso conhecer bem o ponto de partida.

Referências

DRUCKER, P. F. Administrando para o Futuro. 6. ed. São Paulo, SP: Cengage Learning, 1998. | JANNUZZI, P. M. Indicadores Sociais no Brasil – Conceitos, Fontes de Dados e Aplicações. 3. ed. Campinas, SP: Alínea, 2006.
MACHADO, L. M. Entrevista. Reprodução. Dez, 2022. | REDE NOSSA SÃO PAULO. Mapa das Desigualdades – 2022. Nov, 2022. São Paulo, SP. | SÃO PAULO. Observatório de Indicadores da Cidade de São Paulo – Observasampa | SECCHI, L. Políticas Públicas: conceitos, esquemas de análise. 2. ed. São Paulo, SP: Cengage Learning, 2013. UNITED NATIONS. Multidimensional Poverty. Development Issues. n. 3. Oct, 2015.



*Esse conteúdo pode não refletir a opinião da Comunitas e foi produzido exclusivamente pelo especialista da Nossa Rede Juntos.

Artigo escrito por: Vivian Satiro
Diretora de Soluções para Governo na Colab
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